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Última chance II

Por Roberto Pereira D’Araujo

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Continuando o “Última Chance I” e, aventando a hipótese de que teremos um novo período de privatizações onde a Eletrobras pode ser a “joia da coroa”, seria interessante examinar qual foi a nossa experiência com as privatizações da década de 90 e outras estratégias que podem ser interpretadas como uma privatização “por dentro”.

Em primeiro lugar, o dado geral: Na década de 90 até 2006, dados do BNDES mostram que mais de 80 empresas foram privatizadas.

Siderurgia – Usiminas, Cosinor, Piratini, CST, Acesita, CSN, Cosipa e Açominas.

Petroquímica – Petroflex, Copesul, Copene, Polisul, Petroquímica União, Polipropileno, Álcalis, e mais 19 pequenas indústrias.

Fertilizantes – Indag, Fosfértil, Goiásfértil, Ultrafértil, Arafértil.

Elétrico – Escelsa, Light, Gerasul, CERJ, COELBA, Cachoeira Dourada, CEEE, CPFL, CEMAT, Energipe, Cosern, CELPE, CESP Paranapanema, CESP Tietê, CEMAR, Eletropaulo.

Transportes – Malhas da Rede Ferroviária Federal, Mafersa, Ferroeste, Metrô, Conerj, Flumitrens, Menezes Cortes.

Mineração – Caraíba, Vale do Rio Doce.

Portos – Santos, Capuaba, Sepetiba, Rio, Angra, Salvador

Financeiro – Meridional, Banespa, BEG (Goiás), BEA (Amazônia), BEM (Maranhão), BEC (Ceará), BEMGE (Minas), Bandepe (Permanbuco), BANEB (Bahia), BANESTADO (Paraná).

Gás – CEG, Riogás, COMGÁS, Gás Nordeste e Gás Sul.

Outros – EMBRAER, DATAMEC.

Telecomunicações – CRT (Rio Grande do Sul), TELESP, Tele Centro Sul, Tele Norte Leste, Embratel, Telemar.

Provavelmente não tenha ocorrido uma privatização do mesmo porte da brasileira em todo o planeta.

Evidentemente, a primeira pergunta que surge é sobre a razão de que tantos setores tiveram que ser desenvolvidos pelo estado. Entretanto, o dado mais importante é o lado econômico-financeiro dessa grande estratégia.

Considerando todas as empresas vendidas entre 1990 e 2006, o estado brasileiro “faturou” aproximadamente US$ 106 bilhões (dados do BNDES). Atualizando esse valor com o US$ da data desse artigo (R$ 5,42), o total chega a R$ 574 bilhões.

Tal política deveria liberar o estado para cuidar de aspectos sociais deixando que “o mercado” cuidasse da economia produtiva. Entretanto, vejam o que aconteceu com os dispêndios do BNDES.

Reparem que bastariam 2 ou 3 anos consecutivos do período 2009 – 2017, para igualar toda a receita da privatização. Ou seja, ao contrário do prometido, o estado continuou a ser responsável por grande parcela de recursos para “incentivar” o setor privado.

E o que ocorreu com a dívida pública?

Ela dobra de valor em percentagem do PIB, se estabiliza no entorno de 60% – 70% do PIB e, nos últimos anos, caminha para 100%!

A carga fiscal também se eleva.

Outro tema nunca mencionado é que, na transição do sistema de serviço público para o de mercado, a Eletrobras perde sua função de coordenação de planejamento e essa atribuição fica muito mal definida com a promessa de um departamento dentro do Ministério de Minas e Energia.

O sistema anterior era comandado pela Eletrobras através do GCPS (Grupo Coordenador do Planejamento do Sistema). Funcionando como órgão colegiado, sob a coordenação da Eletrobrás, o GCPS passou a desenvolver diversas atividades ligadas ao planejamento da expansão dos sistemas elétricos, notadamente a elaboração do plano decenal de expansão, revisado anualmente. Esses planos decenais recomendavam a instalação de 2.000 MW novos a cada ano, pois a evolução do consumo de energia elétrica sempre apresentou uma tendência bastante crescente e constante.

Vejam o que mostra a evolução da capacidade instalada do sistema desde 1974. O gráfico abaixo mostra o saldo sobre os “obrigatórios” 2.000 MW de um ano para o outro. Capacidade (t+1) – Capacidade (t) – 2000.

Reparem que exatamente o período 1992 – 2003 teve saldo negativo nessa necessária adição de capacidade, chegando a ficar 8.000 MW “devedor”. Além dessa ausência de expansão de geração, a linha de transmissão de 500 kV entre o Paraná e São Paulo (Ibiuna – Bateias) que sempre esteve no planejamento por conectar fortemente as regiões sul e sudeste, foi a leilão e ninguém se interessou. Obviamente ocorreu o racionamento de 2001 e a hidrologia foi a culpada, mas, na realidade, a região Sul não teve racionamento e não pode enviar energia para socorrer o sudeste pela ausência da linha. Ela só foi construída por Furnas após o racionamento. Evidentemente, esses dados nunca foram mostrados, pois é sempre mais fácil culpar São Pedro.

Isso deixa evidente que os recursos privados não são infinitos. Se o estado anuncia a venda da Eletrobras, o capital, sem sofrer exigências, prefere aguardar para comprar usinas e linhas prontas e faturando.

É preciso explicar também o crescimento exponencial da parte em verde. Ao contrário do que se imagina, esse trecho está repleto de aumento de capacidade através de térmicas e, no final, eólicas. Como se sabe, as usinas térmicas acrescentam muitos MW mas poucos MWh, pois são acionadas na medida da necessidade.

Reparem que houve duas estratégias de instalação de usinas térmicas.

A primeira, em marrom, ocorreu por conta do racionamento e pela falta de investimentos em novas usinas. Foram as chamadas térmicas emergenciais. O segundo “Boom” de térmicas ocorreu em função da falta de contratação de expansão da oferta pelos agentes que migraram para o mercado livre. Encargos novos foram criados para socorrer um sistema que se mostrava arriscado. Contratos de “energia de reserva” que, ao todo, impactaram em R$ 150 bi as contas dos consumidores.

Quanto a outros tipos de privatizações, é interessante olhar a estrutura de ativos da controlada Furnas.

As usinas que são propriedade de Furnas estão dentro do quadrado marrom. Logo abaixo, as usinas atingidas pela medida provisória MP 579, que tentou reduzir tarifas às custas de usinas antigas e onde Furnas é uma mera administradora de operação e manutenção. No grande quadrado, os ativos onde Furnas é minoritária em projetos sob controle privado. Mais um incentivo ocluso para um capital pouco pujante. Ou seja, em termos de controle acionário de empreendimentos, fica difícil chamar essa empresa de “estatal” no sentido estrito.

Portanto, como o foco é a nossa experiência em privatizações, espero que o Brasil aprenda alguma lição encarando sua própria história.

Esse artigo foi retirado da publicação feita no site “ILUMINA”, do dia 09 de fevereiro de 2021.

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