A saída da atual “Crise Fiscal” passa por uma MUDANÇA DE DIAGNÓSTICO sobre as causas da “crise fiscal”. Passa pelo abandono da política de redução do Estado em favor de uma política antirrecessiva, voltada para o CRESCIMENTO DO PIB. Tal política consta de todos os manuais de Macroeconomia que já foram publicados. Essa política exige a expansão dos investimentos e gastos públicos — ou seja, exige MAIS Estado, ao invés de menos Estado.
DESMONTE DO ESTADO É DIFERENTE DE AUSTERIDADE
Para início de conversa, um esclarecimento. Não existe uma política de austeridade sendo praticada no Brasil. Isto é uma mentira. Outra mentira é a de que os governos petistas foram gastadores e quebraram o país.
Nos 13 anos de gestão petista” (2003 a 2015) o governo federal teve, em média, superávit primário de 1,6% do PIB. Após o impeachment da Dilma (2016 a 2020), tivemos 5 anos consecutivos de déficit primário, cuja média foi de 3,3% do PIB.
Os governos Temer e Bolsonaro nunca foram “austeros”. Ambos foram PERDULÁRIOS E LEVIANOS. Ambos provocaram aumento explosivo da dívida líquida federal, que aumentou 185% desde 2016.
Bolsonaro imita a política de Temer, que foi uma política de DESMONTE DO ESTADO. Tais políticas impuseram um encolhimento dos gastos primários enquanto mantinham déficits gigantescos e endividamento federal galopante.
QUAL A ORIGEM DO DESEQUILÍBRIO FISCAL?
O gráfico a seguir mostra que, na origem da crise, o superávit primário caiu junto com o PIB. A linha marrom (Resultado Primário) acompanha a queda da linha azul (taxa de crescimento do PIB). O gráfico mostra que há alta correlação entre as duas variáveis. A QUEDA DO PIB produziu o Déficit Primário.
A Tabela abaixo mostra em maiores detalhes como se deu a queda do Superávit Primário. Lembrando que Superávit é igual Receita menos Despesa.
(1) a taxa de crescimento do PIB mergulhou, baixando de 3,0% em 2013 para 0,5% em 2014, depois se tornou negativa em 2015 (-3,5%) e 2016 (-3,3%);
(2) a taxa de crescimento da Receita acompanhou mais que proporcionalmente a queda do PIB: 4,4% em 2013, -4,9% em 2014, -5,2% em 2015 e -3,5% em 2016;
(3) enquanto isso, a Despesa seguiu aumentando, ainda que em ritmo mais lento, até 2015, depois caiu apenas 0,7% em 2016.
Os dados da tabela mostram que os déficits primários foram CONSEQUÊNCIAS da diminuição da Receita, que resultou da queda do PIB. Porém, tanto o governo Temer quanto o governo Bolsonaro atribuíram a “crise fiscal” ao excesso de Despesas e, por sectarismo ideológico, empurraram para o país uma agenda radical de redução do Estado e dos gastos primários.
O Brasil ainda não conseguiu sair da maré recessiva iniciada por Joaquim Levy, o Chicago boy da Dilma, em 2015 porque nos tornamos reféns de uma política de “austeridade” suicida. Botamos na Constituição um teto dos gastos que inviabiliza a aplicação de medidas antirrecessivas e que nos manterá inertes por mais 16 anos, se não for revogado.
COMO SAIR DA RECESSÃO/ESTAGNAÇÃO?
(1) Uma política de expansão dos gastos e investimentos públicos nos tiraria da recessão?
— Sem dúvida. Esta é a receita anticrise keynesiana, aplicada no mundo todo e recomendada pelo FMI. Ela está em todos os livros de Macroeconomia.
(2) Tal política nos ajudaria a eliminar o Déficit Primário que aflige o governo federal desde 2015?
— No curto prazo, não. O aumento das Despesas, em um primeiro momento, provoca aumento do déficit primário.
Mas, no longo prazo, a economia deve sair da recessão, provocando o aumento da Receita Tributária e reequilibrando o Orçamento. Pois o Déficit Primário foi desde o início resultado da QUEDA DA RECEITA, não aumento das despesas.
(3) No caso particular do Brasil, não seria MAIS DIFÍCIL equilibrar o orçamento fiscal aumentando gastos?
— Se o Teto dos Gastos do Michel Temer for mantido, nenhuma política antirrecessiva pode ser aplicada. Mas, já existe um consenso de que o teto precisa ser revogado. Se ele for revogado, o Brasil teria MAIS FACILIDADE em equilibrar o orçamento do que outros países. Pois o Brasil é um paraíso fiscal para os ricos e para as grandes empresas.
Vivemos em um país em “crise fiscal” que concede escandalosas isenções tributárias a grandes grupos econômicos. Tais isenções estão explicitadas nas Leis Orçamentárias da União. É um escândalo que ocorre à luz do dia, ano após ano.
Vamos a um exemplo. Em 2019, o Déficit Primário do Governo Central foi de 95 bilhões. Naquele ano, o Governo Federal renunciou à arrecadação de 308 bilhões. Se Paulo Guedes reduzisse as renúncias tributárias em um terço ele teria zerado o déficit primário em 2019, sem efeito recessivo na economia. Pois os 308 bilhões vão, em grande parte, para o bolso de grandes grupos econômicos que não reinvestem o dinheiro dos tributos que o governo perdoa.
(4) Você RECOMENDA a geração de superávits primários para tirar o Brasil da recessão?
— Esta é uma discussão antiga com dois amigos, partidários como eu da Nova Teoria Monetária. Pela décima vez repito que não recomendo os superávits primários. Pelo contrário. Como keynesiano, acredito que a recuperação seria mais fácil e mais robusta se o governo federal mantivesse Déficits Primários. Estou apenas tentando demonstrar que o equilíbrio orçamentário defendidos por Ciro Gomes, entre outros políticos, não só é COMPATÍVEL com a retomada do crescimento do PIB, como seria o resultado natural da retomada do crescimento.
(5) Como você resumiria sua proposta para solucionar a “Crise Fiscal”, ou seja, para transformar os atuais Déficits Primários em Superávits Primários?
— Superávit é igual Receita menos Despesa. O segredo é mirar o aumento da Receita, não a redução da Despesas. A Receita pode ser aumentada mediante redução das renúncias tributárias. Ou mediante a retomada do crescimento do PIB, o que exigiria mais Estado e não menos Estado.
Brasília, 18 de maio de 2021
Petronio Filho