1.-Navegando por mares tumultuados da Internet, eu me deparei com a seguinte notícia:
Agencia Pública, 29-05-2018
Segundo Parente, seja qual for a periodicidade que as correções nos preços deverão ser aplicadas após a decisão do governo, o que interessa à empresa é ter a liberdade de aplicar os reajustes que sejam derivados das condições do mercado. “Dentro do que está em discussão com o governo, está mantida, sim, independentemente da periodicidade, a nossa prerrogativa de fazer os ajustes que sejam necessários. Nós vamos ser, sem dúvida, bastante transparentes quanto a isso”, garantiu o presidente da Petrobras.
Muito espantada fiquei, pois interpretei o parágrafo acima de maneira bem direta, como se ali estivesse escrito nas entrelinhas
NÓS, O MERCADO, ELEITO À CATEGORIA DE DIVINDADE SUPREMA DESSE IMPÉRIO OCIDENTAL, DECLARAMOS ESTAR ACIMA DO GOVERNO DO PAÍS DENOMINADO BRASIL, EM TODA E QUALQUER DECISÃO SOBRE PETRÓLEO BRASILEIRO E SEUS DERIVADOS.
2.-Lembrei-me então de outra noticia, da FSP/UOL, em 31-12-1997, anunciando mudanças recentes na política do petróleo. Entendi eu então que não teríamos mais controle sobre preços ou sobre margens de comercialização, nem outros limites de competência do Estado brasileiro. Estaria assim aberto o processo de liberalização dos preços na totalidade da cadeia produtiva de petróleo, gás natural e biocombustíveis. Rememoro alguns parágrafos:
Mas foi somente a partir da Lei do Petróleo (Lei nº 9.478/1997) que a liberalização no mercado de combustíveis automotivos se deu de modo mais efetivo, tendo sido concluída em 31 de dezembro de 2001. A partir dessa data, os reajustes nos preços dos combustíveis passaram a caber exclusivamente a cada agente econômico – do poço ao posto revendedor –, que estabelecem seus preços de venda e margens de comercialização em cenário de livre concorrência.
A Lei do Petróleo também criou a ANP e conferiu-lhe a competência para implementar a política energética nacional no que se refere a petróleo, gás natural e biocombustíveis, com ênfase na garantia do suprimento de derivados de petróleo, de gás natural e seus derivados e de biocombustíveis em todo o território nacional, e na proteção dos interesses do consumidor quanto a preço, qualidade e oferta desses produtos.
Dado que a Agência não controla preços ou quantidades de quaisquer produtos, essas atribuições legais devem ser exercidas por meio da proteção do processo competitivo nos mercados, uma vez que a Lei do Petróleo estabelece, também, a promoção da livre concorrência entre os princípios e objetivos da política energética nacional. (FSP/UOL de 31 de dezembro de 1997)
3.-Estranhei na ocasião, o fato de não haver qualquer lei de criação da categoria administrativa AGÊNCIA DE REGULAÇÃO.Mas em janeiro do ano seguinte, 1998, outra lei anunciou o início das operações da ANP / Agência Nacional do Petróleo, sob o comando de David Zylbersztajn, seu diretor geral por dois períodos. Foi na qualidade de diretor geral da ANP que D. Zylbersztajn realizou o primeiro leilão de áreas de exploração, aberto à iniciativa privada, em 15 e 16 de junho de 1999.
Hoje, apenas hoje, entendo que foi da forma enunciada acima que ocorreu a quebra do monopólio da Petrobrás na exploração do petróleo do Brasil (sic, wikipédia, acesso em 23 de março de 2022). Não houve lei específica nem debate no Congresso Nacional. A sociedade e a democracia parecem ter sido atropeladas.
Antes de assumir a ANP, DZ fora secretário de energia de M. Covas em São Paulo, comandando o plano de reestruturação e privatização de empresas energéticas paulistas.
4.-Continuando a pesquisa, ainda encontrei 2 portarias do final do governo FHC. Sua leitura ratificou minha convicção atual:
a abertura do mercado brasileiro de combustíveis foi uma decisão do governo FHC.
Tratava-se, por um lado, da portaria interministerial MF/MME N. 240 de 27-07-2001, liberando os preços de venda de óleo diesel nas unidades comércio atacadista e varejista. Outro documento anunciava que de 1º. de janeiro de 2002 em diante, deveria vigorar o regime de liberdade de preços no mercado de combustíveis automotivos. [1]
5.-Recuando ainda mais no tempo, encontramos o PROGRAMA NACIONAL DE DESESTATIZAÇÃO I (Lei N. 8.031 de 12-04-1990) e o PND II (Lei N.9.491 de 09-09-1997), sendo que este último, no seu artigo I esclarece os objetivos fundamentais do PND. Assim:
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º O Programa Nacional de Desestatização – PND tem como objetivos fundamentais:
I – reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público;
II – contribuir para a reestruturação econômica do setor público, especialmente através da melhoria do perfil e da redução da dívida pública líquida;
III – permitir a retomada de investimentos nas empresas e atividades que vierem a ser transferidas à iniciativa privada;
IV – contribuir para a reestruturação econômica do setor privado, especialmente para a modernização da infra-estrutura e do parque industrial do País, ampliando sua competitividade e reforçando a capacidade empresarial nos diversos setores da economia, inclusive através da concessão de crédito;
V – permitir que a Administração Pública concentre seus esforços nas atividades em que a presença do Estado seja fundamental para a consecução das prioridades nacionais;
VI – contribuir para o fortalecimento do mercado de capitais, através do acréscimo da oferta de valores mobiliários e da democratização da propriedade do capital das empresas que integrarem o Programa.
CONCLUINDO: Para liquidar a Era Vargas, Fernando Collor de Melo e Fernando Henrique Cardoso foram responsáveis por todos os passos iniciais, no período 1990/2002. Incluída a privatização da Petrobrás. Daí decorrem os desvarios atuais nos preços de petróleo e derivados.
Uma outra pesquisa deverá ser realizada para fins de elucidação do papel do CADE/MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, na determinação do PREÇO PARITÁRIO DE IMPORTAÇÃO. Decisão com imensas falhas, é provável.
Não se deveria atribuir tanta responsabilidade a situações institucionais ou configurações sociais onde o que menos existe é a livre concorrência …. o tal mercado competitivo … que exigiriam, na doutrina neoliberal, a não intervenção do Estado.
Por enquanto trata-se de um mito, um fetiche. Serve aos servos ou seguidores do Deus Mercado, conforme nos orientou Dany Robert Dufour, entre outros filósofos e intelectuais da atualidade !