Uma semana depois que o presidente Alberto Fernandez anunciou entrada da Argentina no BRICs(Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), abertamente, combatido, na América do Sul, pelos Estados Unidos, cai o ministro da Fazenda, Martin Guzmán, responsável pela renegociação com o FMI, incapaz de reduzir a inflação na casa dos 60% em 12 meses; as pressões sobre as orientações neoliberais implícitas no acordo com FMI, que Guzmám acertou em Washington, sem consenso em Buenos Aires, diante da FRENTE DE TODOS, coalização política que sustenta o peronismo, acabaram por derrubar o ministro; entrará em seu lugar, Silvina Batakis, aliada da senadora peronista Cristina Kirchner, crítica do acordo com FMI e favorável a um acordo com o BRICS, alternativo à receita neoliberal.
Batakis, ex-ministra da economia da Província de Buenos Aires e atual ministra das Províncias do Interior de Fernandez tem como primeira tarefa atacar a inflação, tarefa impossível de ser vencida pela receita neoliberal do FMI; fortalece, dentro do governo, Cristina Kirchner, responsável maior pela queda de Guzmán, considerado irresponsável por Fernandez pela decisão unilateral de deixar o posto, vulnerabilizando, politicamente, o presidente; Cristina bateu de frente com Guzmám ao considerar equivocados os argumentos do FMI de que a inflação em alta requer maior arrocho fiscal, cujas consequências são redução do poder de compra dos salários em favor dos rentistas nacionais e internacionais.
A posição de Kirchner, respaldada pela FRENTE DE TODOS, visa sintonizá-la com sua base política peronista, prejudicada pelo acordo que Guzmám fechou com Washington, para satisfazer, relativamente, os neoliberais; o neoliberalismo, dessa forma, levou a pior e abre, na Argentina, frente de luta para fortalecer a correlação de forças políticas favorável à FRENTE DE TODOS contra os adversários, já visando sucessão presidencial.
CHINA NOVO ALVO ARGENTINO
No fundo desse cenário político de lutas ideológicas, ganha força a tendência, em crescimento na Argentina, ao avanço de acertos econômicos com a China, no âmbito dos BRICS, cuja proposição política é de nova cooperação internacional, na linha do plurilateralismo em oposição ao unilateralismo defendido por Washington; nova geopolítica sul-americana entra em cena, com Pequim abrindo espaço no confronto com Washington, para expansão da China na América do Sul; rompe-se a geopolítica de Tio Sam da Doutrina Monroe de garantir a América para os americanos a qualquer custo.
Xi Jiping, presidente da China, põe em discussão na América Latina crítica a teoria do FMI de que a inflação capitalista decorre do excesso de demanda, a requerer arrocho fiscal neoliberal, que, na prática, não tem reduzido, mas ampliado da inflação; os chineses, que tocam a economia sob coordenação do Partido Comunista, visando ampliação dos gastos públicos como arma para desenvolvimento econômico sustentável, consideram que a visão unipolar americana é a responsável principal pela inflação geradora de subconsumismo, com queda dos salários; põe, no lugar dela, o plurilateralismo, ancorado em cooperação econômica, melhor distribuição de renda etc; é com essa estratégia que os chineses ganham a competição com os Estados Unidos, abrindo espaço para expansão da Eurásia, rota da seda e nova institucionalidade, desdobrando-se em proposta de nova ordem financeira internacional, com novo sistema monetário alternativo à hegemonia do dólar.
O peronismo mais radicalizado com Cristina Kirchner do que com Alberto Fernandez, em sua tendência conciliadora, prepara, dessa forma, programa econômico mais agressivo contra as diretrizes ditadas por Washington, na esperança de que, como novo integrante dos BRICS, seja amparado por Pequim com propostas de novos investimentos na Argentina sem as condicionalidades impostas pelo FMI; estas, na prática, inviabiliza crescimento sustentável, proporcionando mais investimentos no país, sem os quais não haverá jamais nem efetivo combate à inflação, nem aumento da oferta de emprego.
O ajuste fiscal washingtoniano, que acaba de derrubar Martin Guzmám, tem, ao contrário, contribuído para o empobrecimento argentino e latino-americano, intensificando deterioração nos termos de troca, cujas consequências são instabilidade cambial, desindustrialização e desemprego. A caída do ministro Guzmam e a subida da ministra Batakis, que mobiliza, inclusive, as avós das Praça de Maio, é sinal para o futuro do neoliberalismo tocado por Paulo Guedes, no Brasil, incompatível com a vontade popular, como prenunciam as pesquisas favoráveis à candidatura Lula, abertamente, apoiada, semana passada, por Alberto Fernandez.
César Fonseca
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