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OSÓRIO DA ROCHA DINIZ, autor e economista à moda antiga

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Ceci Vieira Juruá
Ceci Vieira Juruá
Economista, mestre em desenvolvimento e planejamento econômico, doutora em políticas públicas. Foi servidora pública e professora do Departamento de Economia na Faculdade Católica de Brasilia. Atualmente é pesquisadora independente em temas relativos a Finanças Públicas e História Econômica. Integra o Conselho Diretor do Centro Internacional Celso Furtado e o Conselho Consultivo da CNTU-Confederação Nacional de Trabalhadores profissionais liberais Universitários.

Por Ceci V. Juruá (RJ, agosto 2022)

 

O sonho de Osório da Rocha Diniz (ORD), tal como ele o expressou na obra “O Brasil em face dos imperialismos modernos” 1) foi o aproveitamento das fontes brasileiras de energia para que pudéssemos fazer do Brasil uma grande nação industrial, repetindo de certa forma o sucesso das nações líderes da economia mundial nas primeiras décadas do século XX : Inglaterra, Alemanha e Estados Unidos.  Faço a seguir uma breve síntese do primeiro capítulo desta obra, capítulo  que tem por título “Fontes de energia e matérias primas, escravizando povos e forjando Impérios.”

 

Inicialmente ORD discorre sobre a industrialização alemã. Explica que foi graças à indústria que a  Alemanha, um país agrícola antes de 1870,  conseguiu ultrapassar a França em matéria de valor das exportações internacionais. De fato,  a Alemanha pôde se tornar uma potência comercial, como os Estados Unidos, depois de dispor de uma organização bancária de alto nível e de uma marinha mercante própria.

 

Com o novo status de país industrial, a Alemanha foi capaz de acolher um forte crescimento populacional,  não sendo mais necessário emigrar, como ocorrera nas décadas que antecederam 1870.   A indústria passou a garantir emprego para todos,  mantendo o ritmo de  expansão comercial.

 

O acréscimo, depois de 1896, é anualmente de 1.000.000 de indivíduos, – o que a França só consegue em 15 anos. (p.19)

 

Apoiado nos casos que analisou, dizia ORD que a nossa expansão econômica deveria ocorrer mediante o ingresso na arena industrial,   com intensificação de esforços na expansão do vapor, na potência do petróleo e na ação da energia elétrica.

 

Exuberantes são os números apresentados em matéria de produção siderúrgica norte-americana: apenas 20 mil toneladas em 1820,  e notáveis 14 milhões de toneladas no ano de 1900.

 

Comparando o  Brasil aos países bem sucedidos na produção de ferro –   Estados Unidos,  Alemanha, França,   Inglaterra, Japão,  Itália -, ORD  observa que o Brasil não está entre os dez maiores países produtores de ferro em 1928, apesar de possuir, na ocasião,  25% das reservas mundiais do minério de ferro.

 

A Inglaterra, quando aplicou o ferro à navegação, tornou-se senhora do mundo.

 

Produzir ferro e construir máquinas, -foi o segredo da expansão da Inglaterra, … (p.22)

 

No Brasil, a explicação do atraso em matéria de indústria e progresso, deve-se à herança colonial. Escreve ORD que a longa vivência como feitoria de exploração  tropical, e o fato de ainda estarmos dominados pelos reis das finanças internacionais, colocam-nos em situação de atraso, distante do conjunto de países que lideram o progresso material nesse início do século XX. Não podemos acusar nossos antepassados, pois eles cumpriram uma tarefa árdua com sucesso e nos legaram um  imenso território unido sob um só governo, falando uma só língua, com uma só bandeira, cultuando as mesmas tradições.

 

O século XIX foi o século da Inglaterra, graças ao carvão e ao ferro, com o amparo do comércio marítimo.  Mas agora já surge um novo monarca, Sua Majestade, o Petróleo!…  acentua ORD. A luta pelo petróleo já vitimou o México, a Venezuela e a Rússia, breve chegará a nós.  Nós que vivemos em país onde causa pasmo a quietude e despreparo militar, econômico e industrial, enfatiza nosso autor.

 

Não devemos esquecer o que aconteceu na Amazônia brasileira, de onde fomos deslocados pelos ingleses e onde à opulência sucedeu a miséria, acentua ORD. Em  1894 Manaus foi uma das mais alegres, florescentes e modernas cidades do Brasil, graças à produção de borracha.  Entre 1890 e 1910 a produção dessa mercadoria mais do que dobrou, o preço praticamente triplicou, e logo a seguir, em 1912, a exportação de borracha nos rendia mais do que a exportação de café.  Pouco depois os centros produtores deslocaram-se para a Ásia, vimos então a miséria suceder à opulência na região !… Em 1892 o Brasil fornecera 60% da produção mundial, no entanto em 1930 foram as colônias inglesas e holandesas do Oriente que forneceram 93% da produção mundial.

 

…(somos) um país de completa desorganização – saqueador dos frutos extrativos do seu solo (p. 39)

 

Além de nossas fragilidades, ORD destaca o enfrentamento, na selva amazônica, entre o imperialismo japonês e norte-americano, – cujas consequências jamais poderemos prever, e outros problemas.

Mas, neste transe de nossa vida… outros e mais graves problemas ainda vieram se sobrepor à cabeça dos brasileiros.  Surgiu o problema do manganês e o problema do algodão. (

Aqui faço um parênteses, para observar que a exportação brasileira de manganês, para Europa e Estados Unidos,  iniciou-se ao final do século XIX após a chegada do transporte ferroviário a Queluz (MG) e localidades próximas. Apesar das vantagens representadas pelo  alto teor de manganês brasileiro, os importadores estrangeiros reclamavam, com frequência, do alto preço do transporte ferroviário.  Por outro lado, com a chegada de Getúlio ao poder (1930) houve a promulgação de um CÓDIGO DAS MINAS nacionalizando a exploração de recursos hidrelétricos e minerais (Decreto 24.642 de 10.07.1934).  Durante a década anterior, anos 1920, ocorreram sucessivos atritos em Minas Gerais, entre  governantes e exploradores estrangeiros de minérios.

Sobre o algodão, sabemos a que Alemanha era nosso principal comprador, nos anos 1930,  e que os pagamentos eram feitos em  moeda local,  por troca compensada, em razão de dificuldades de natureza cambial.

Retomando a apresentação do precioso primeiro capítulo desta obra magistral, devo destacar preciosa advertência do Prof. OSÓRIO DA ROCHA DINIZ, relativamente à sagacidade dos americanos do Norte.  Fez isto analisando fatos ocorridos com o café e a borracha, quando o Sr. H. Hoover era presidente dos EUA. Em sua análise, ORD adverte que “os norte-americanos não assistirão impassíveis ao decréscimo de sua produção algodoeira” por exemplo. Em qualquer caso, devemos sempre esperar, da parte deles, uma ofensiva no sentido de readquirir o mercado perdido.  E se esta ofensiva falhar,

teremos a pressão norte-americana noutros setores de nossa atividade, seja diretamente, seja tributando o nosso café, seja nos atrofiando economicamente, ou por outros meios que o momento ditar… (p.42)

Parece-me igualmente sagaz a observação de ORD, quando expõe a convicção que os centros mundiais de uma indústria global se deslocam sem cessar, tanto no passado como no futuro, em direção às proximidades  de mercados consumidores e dos fornecedores de matérias primas, ou para locais com abundância de mão- de- obra e de fontes perenes de energia.

Há razões de sobra, explica, para que ingleses e outros grandes povos industriais e imperialistas não queiram que nos tornemos uma potência industrial, e é com tal finalidade que alegam uma série de fantasias, de doutrinas já decadentes e de dogmas pseudo-econômicos e científicos

Quando ORD observa

…daí a inquietude dos povos industriais pelo nosso desenvolvimento industrial, – sintetizado no seu máximo expoente que é a siderurgia e, daí, o procurarem comprimi-lo… (p.50),

meu pensamento volta-se, imediatamente, para a sagacidade de Getúlio, cujas primeiras decisões, no campo da produção, foram a codificação de uma tríade – Águas / Minas e  Floresta – e a criação da COMPANHIA SIDERÚRGICA NACIONAL/CSN.

Tampouco foi por acaso que CSN e CVRD/Companhia Vale do Rio Doce, executora do monopólio extrativo, tenham sido as primeiras grandes estatais sacrificadas no altar diabólico da globalização. Naquela perversa década de 1990.  Tinha razão em  nos advertir o Prof. Osório da Rocha Diniz.

Termino esta breve apresentação com palavras do próprio Osório da Rocha Diniz, fundador, com outras personalidades, da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais/UFMG, amigo de Monteiro Lobato, personalidade escolhida pelo Presidente Vargas para integrar o grupo que criou a Petrobrás, articulista do Informador Comercial (atual Diário do Comércio) e participante ativo da Associação Comercial de Minas Gerais, faleceu em 1983 aos 79 anos, em Belo Horizonte.

 

“… enquanto os norte-americanos escrevem uma nova página de sua história na conquista de um “império elétrico na América Latina”, (…) nós assistimos à ocupação de nosso território  por forças adversárias e não reagimos!…

Já uma só companhia de Nova York é proprietária de metade dos telefones instalados na América Latina e, quiçá de 95% dos telefones instalados no Brasil!…

Outra companhia possui e administra por intermédio de suas “SUBSIDIÁRIAS” mais da metade de todas as fontes de energia elétrica da América Ibérica e, mais de 90% da parte que toca ao Brasil.

Com o domínio das usinas elétrica vão os cabos submarinos, as linhas de transmissão e as estações rádio-transmissoras comerciais.

… recorre-nos a pergunta: – Quo- Vades Brasil ?

Será que não queremos ver o que está sendo tramado contra nós, o que está nos impelindo para a escravidão, para o desprestigio, para a tutela econômica, para a estagnação, para o separatismo, para o desaparecimento da face da terra como nação independente ?

__________  FIM

1)OSÓRIO DA ROCHA DINIZ.  O Brasil em face dos Imperialismos modernos.  Série 5a. Brasiliana, Vol. 183. Biblioteca Pedagógica Brasileira. São Paulo-Rio de Janeiro-Recife-Porto Alegre: Companhia Editora Nacional, 1940.

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