Petronio na Casa de Lucídio
Fonseca Neto, 13/02/2023
Discreto e incisivo ele veio e disse. Deixou com os da Casa um livro com mais dicção sobre o que pensa do Brasil neste trânsito de séculos. Sua formação acadêmica é em Ciências Sociais, Economia.
Refiro-me a Petronio Portella Nunes Filho, economista, que esteve há pouco na Academia Piauiense de Letras, lançando seu mais recente livro, trazido com o título Mentiras que contam sobre a economia brasileira. E a primeira e disparada entre essas mentiras é mesmo o desmoralizável chavão de que a economia é assunto próprio de “cientistas” ou doutos especialistas. Sua abordagem vem orientada em noção de Luiz Davidovich de que “a economia é importante demais para ficar só na mão dos economistas”.
Do livro sob foco é seu autor que informa no subtítulo, alongado e esclarecedor, que são “textos contra a desinformação e em defesa de políticas novas e velhas pró-crescimento”.
Além de Davidovich, também invoca na epígrafe outro tuchá em sua matéria, André Lara Resende, para quem a “macroeconomia [pode] ser compreendida por qualquer pessoa educada. Não pode ficar restrita a um grupo de iniciados que utiliza um dialeto pretensamente científico”.
Ele não economiza palavras com o fito de desbancar os que, na “grande imprensa”, como “economistas de mercado”, “se consideram acima das ideologias. Muitos deles possuem vínculos com instituições financeiras – dedicam suas vidas a defendê-las. Mas se apresentam como porta-vozes da ‘neutralidade científica’. E graça ao espaço que conquistaram na mídia, conseguiram transferir a ideologia do setor financeiro para empresários, classe média e funcionários públicos”.
Com tais orientações, Nunes Filho faz um livro relativamente curto – 152 p. – e com imensa potência explicativa, “para especialistas e leigos”. Pares economistas e o povo em sentido mais amplo. Editora Dialética, SP.
Organiza a obra em quatro partes, cada uma com subpartes, todas com títulos-quase-teses, tratando temas e questões que no dia a dia da mídia e dos circuitos do Poder são filtrados em linguagem, como que oracular, de compenetrados figurões “da Economia”.
Recuperando a noção fundamental de Economia Política – ojeriza dos neo e ultraliberais –, revisita logo na primeira parte o cenário que feriu quase à depressão a economia, precipitando a miserabilização da sociedade brasileira, a partir do golpe de 2016, que às vezes chama de impeachment. E busca, noutras partes, e no contexto imediatamente anterior, localizar decisões macroeconômicas equívocas, de Fernando Cardoso a Dilma Rousseff, fundadas na posição neoliberal tida por inexorável pelo mercado” e seus “cientistas”.
Muito atualizado e apresentando um arsenal de números reveladores, o autor demonstra, de maneira didática, o quanto a obra de “fanáticos” ultraliberais, entre 2016 e 2021, conduzem o Brasil à estagnação, com a destruição do Estado-investidor. Lembra que o “ultraliberalismo é baseado numa ideia digna de Einstein. Proíba o maior investidor, o Estado, de investir e o obrigue a cortar gastos na carne – que a economia irá decolar” com o investimento privado. Mentira em estado puro.
Keynesiano, patriota e desenvolvimentista lúcido, Nunes Filho destroça essa maldade e desnuda a política “técnica” de Paulo Guedes. Cita o desastre que o golpe ultraliberal de Pinochet impôs, e que continua a “inspiração” de Guedes, “um predador inescrupuloso e um mitômano compulsivo”. No plano do debate, opõe o guede-bolsomorismo, apresentando as linhas do chamado “projeto nacional” do então presidenciável Ciro Gomes, lançado em julho de 2020.
Ele fecha seu livro apresentando a MMT (Teoria Monetária Moderna), com a qual André Lara Resende – melhor economista do Brasil, segundo ele – “tenta nos salvar da recessão crônica…”.
Petronio na Casa de Lucídio: acadêmicos, parentes e mais público esclarecido acorreram à APL para ouvir a palestra do autor, um teresinense, doutor, “consultor legislativo por profissão”, pois passou “três décadas fazendo o que [tenta fazer no] livro: explicar fenômenos econômicos complexos para não-economistas”, “vítimas contumazes da desinformação”.
No caso da consultoria institucional legislativa, sua interlocução, os senadores da República. Um livro necessário, a ser lido com a devida atenção e merecido respeito. Obra de um radical sereno cuja verdade que leciona libera ao País o robusto democrata que é.