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O mercado e a política econômica

Por Flávio Tavares de Lyra

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Flávio Tavares de Lyra

Brasília, 10/02/23.

O episódio recente da crítica de Lula à atuação do Banco Central com manutenção da alta taxa de juros básica (SELIC) em nome do combate à inflação, precisa ser entendida no contexto mais amplo e de longo prazo da disputa entre o poder econômico (o mercado) e o poder político na sociedade brasileira.
O poder econômico, sob a hegemonia do capital financeiro, particularmente do oligopólio bancário privado, alicerçado na visão de mundo neoliberal, tem aumentado ao longo do tempo o controle que exerce sobre o poder político e levado à subordinação crescente da política econômica às intenções do mercado.
As consequências nefastas do predomínio do pensamento neoliberal para o desenvolvimento do país e para a concentração da renda e da riqueza nas mãos da minoria capitalista têm sido notórias, em detrimento da classe trabalhadora e da grande maioria da população. A estagnação econômica e a desindustrialização que têm levado à perda persistente da posição do país no contexto internacional são apenas a outra face da moeda dos altos índices de desemprego, dos baixos salários, e da miséria crescente da população.
O crescimento de forças políticas simpatizantes do autoritarismo de cunho nitidamente fascista, exacerbadas durante o governo de Bolsonaro tem muito a ver, por um lado, com o desespero da população pela precarização de suas condições de vida e, por outro, da ação dos segmentos da classe capitalista que se beneficiam da valorização da riqueza financeira que mobilizam essas forças sociais em favor de movimentos antidemocráticos.
0 crescente controle do mercado sobre o poder político tem levado a um modelo de política econômica que bloqueia a formação de capital na economia. Isto, seja através da contração do financiamento do investimento público na infraestrutura econômica e da promoção do desenvolvimento tecnológico, seja através de uma política monetária que, em nome do combate à inflação, mantem as taxas de juros reais excessivamente elevadas, prejudicando o financiamento do investimento público e o financiamento da formação de capital produtivo no setor privado.
É, igualmente, o poder do mercado que influencia o poder político para impedir uma reforma tributária que favoreça a redução da desigualdade na distribuição da renda, assim como a adoção de uma política salarial que favoreça os segmentos mais prejudicados da população e, assim, contribua para a ampliação do mercado interno.
A vitória das forças de esquerda na eleição recente que trouxe Lula ao poder central, busca representar,, pois, uma tentativa de recuperação do papel do poder político sobre o poder do mercado, o que concretamente se traduz em três linhas de ação: a) uma reforma fiscal que aumente a capacidade financeira do Estado para financiar o investimento público, o gasto na área de ciência e tecnologia; e a desconcentração da renda ; b) a reorientação da política monetária, a cargo do Banco Central, para que reduza a taxa de juros real que incide sobre a dívida pública e o gasto público, bem como sobre a oferta de financiamento para o setor privado; e c) uma política salarial que assegure o aumento real do salário mínimo.
Sem alterações substanciais nesses três pilares da política econômica, que significarão aumentar a autonomia do poder político sobre o poder econômico, representado pelo mercado, não haverá como sair do pântano da estagnação econômica, das desigualdades sociais e da crescente miséria.
A reação de Lula, frente à atuação do Banco Central, faz, pois, todo sentido à luz de sua estratégia de governo apoiada na concepção de que é preciso romper com o atual modelo de dominação do mercado sobre o poder político, como condição para recuperação da capacidade do país para crescer e melhorar as condições de vida da maioria da população. O que fazer está bastante claro, resta agora conhecer o que fazer no plano político para tornar viável as mudanças pertinentes.

Flávio Tavares de Lyra é economista da Escola da UNICAMP e Ex-técnico do IPEA.

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