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Gustavo, Nildo e o movimento de Lula em direção ao leste

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A avaliação levada a cabo por Nildo Ouriques e Gustavo Gindre da recente viagem de Lula à China – e de tudo o que veio junto – é, a meu ver, ruim.

Vou direto ao ponto: nosso bravo e queridíssimo Lênin-de-Joaçaba alcunha Lula com epítetos tais como “político de quinta”, “vulgar” etc.; e vendo tudo à luz dessa caracterização, cega-se, e, por consequência, não alcança o que está verdadeiramente em curso.

Gustavo dá indicações de padecer da mesma cegueira…

A cegueira “ad hoc” de ambos não os permite levar em consideração um ponto decisivo para a compreensão do movimento na direção Leste de Lula.

Ambos veem alguns aspectos da personalidade de Lula, mas desconsideram outros, e, sobretudo, desconsideram o peso e a importância da atual circunstância existencial e política do presidente.

O personagem e as suas circunstâncias! Ah, Ortega y Gasset… O pensamento aristocrata tem as suas verdades…

Quanto à vulgaridade, digo o seguinte: de fato – como não reconhecer? –, desde a promulgação da Constituição de 1988, a política praticada entre nós, ao centro, à direta e à esquerda, foi e vem sendo, por lhe faltar um mínimo de dimensão nacional e popular, em geral, “vulgar”.

Contudo, repito, há um fato de suma importância negligenciado pelos dois, razão de suas cegueiras “ad hoc”.

Esse fato carrega em si um potencial, digamos, trágico, o que pode – de certa forma, e em alguns aspectos, ainda que limitados – obrigar Lula a se impor diante da generalizada e dominante “vulgaridade”.

Refiro-me, insisto, à personalidade de Lula, confrontada com a sua atual circunstância existencial e política.

A desconsideração desse fato de potencial trágico reduz avaliação de ambos a uma, olhem só, “vulgaridade” de tipo psicologizante…

O movimento em direção a China e Rússia foi saudado pela máquina lulista com o seu oba-oba apologético costumeiro. Esses pecam por “hiper” valorização; enquanto os queridos companheiros pecam por “sub” valorização.

Gustavo e Nildo – eis aqui a razão da “vulgaridade” de suas análises – desconsideram o fato que o Lula que tomou posse em primeiro de janeiro de 2023 não é o mesmo que passou a faixa presidencial a Dilma.

Entre um momento e o outro houve o “impeachment” e os 580 dias que Lula passou na cadeia.

Esses dois acontecimentos extraordinários – eis o pressuposto da minha análise –, certamente, fizeram ruir aquele “sonho de uma noite de verão” acalentado por Lula, pela quase totalidade da direção petista e pela cúpula de sua máquina burocrática.

Falo do sonho de serem aceitos no “clube dos bacanas”…

Acreditaram, candidamente, que a “Carta aos banqueiros” e os compromissos honrados na presidência da República seriam o “visto de entrada”, a primeira, e o “green card”, o segundo, para o mundo burguês.

E deu no que deu: humilhação pública. Um pontapé na bunda de Dilma e uma longa temporada em cana para Lula foram um choque de realidade brutal para os que, até então, achavam que tinham sido aceitos no “Jardim das delícias”…

Foram tremendos “zé manés”, sem dúvida, mas humilhação pública de tal monta não é esquecida, sobretudo por pessoas como Lula.

Lula, estou certo, sabe que ele só foi aceito de volta porque a plutocracia não tinha alternativa para se livrar do bode-na-sala que sempre foi Bolsonaro.

Sabe também, creio, que o seu retorno ao “clube” é provisório e a sua permanência entre os bacanas tem, como na vez anterior, prazo de validade.

Lula e, suponho, todos no PT, sabem que a “anistia” de que foram beneficiários só irá até a página 3 de seu governo.

Lula foi obrigado a sentir na própria pele a realidade de que a plutocracia é inabalável em seu ódio de classe, impiedosa em seus métodos, e que ele jamais será reconhecido como um “igual”.

Uma vez realizada a tarefa de expulsar do Palácio do Planalto Bolsonaro e sua turba, vencida a “invasão dos bárbaros”, Lula e os petistas sabem que seu governo estará sempre sob a ameaça de “impeachment”.

A vida ensina…

E é aqui que entra o centro do meu argumento: Lula jamais aceitará sair do governo escorraçado, como muito provavelmente são o desejo e o projeto da plutocracia.

Certamente, esse é a prioridade número 1 não apenas de seu governo, mas de sua vida!

É essa dimensão, digamos, trágica, do confronto da personalidade de Lula com a sua atual circunstância que escapa a Gustavo e a Nildo, cegos “ad hoc”.

Ou Lula se impõe, ganhando alguma autonomia frente à plutocracia rentista, ou ele e o PT serão mais uma vez lançados no esgoto.

Neste terceiro mandato, Lula enfrenta contradições mais agudas do que as que enfrentou nos mandatos anteriores.

A guinada a Leste, com todas as ambiguidades com as quais vêm se revestindo, não tem outra razão de ser senão a de possibilitar a Lula e ao seu governo alguma autonomia frente à plutocracia local e algum poder de barganha frente à potência imperialista hegemônica.

Sem o ganho de alguma autonomia frente ao rentismo e de algum poder de barganha frente aos EUA, não há aumento da atividade econômica possível, e sem aumento da atividade econômica, o caminho para a desmoralização de Lula e do PT – sonho secreto dos bacanas –, estará pavimentado.

O que salvou Lula do tsunami do “Mensalão” foi a economia, não nos esqueçamos.

A economia, sempre ela…

Limitado a cumprir estritamente a agenda neoliberal, como quer a plutocracia rentista, a economia continuará no buraco em que se encontra, e Lula estará a um passo do cadafalso.

A guinada à Leste de Lula não tem outro objetivo senão o de, sem confrontar os fundamentos da agenda neoliberal, aquecer a economia.

Sem economia aquecida, Lula será humilhado mais uma vez. E desta vez, ele não terá tempo para dar a volta por cima.

A personalidade do político e a sua circunstância, quem não reconhecer o peso e a importância dessa relação, não irá compreender o que está em curso…

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