Matérias primas essenciais para as novas tecnologias estão sendo exportadas pelas empresas estrangeiras que estão se instalando e adquirindo as mineradoras e reservas do país
A discussão sobre as possibilidades do Brasil se beneficiar, em seu processo de reindustrialização, com o uso das novas tecnologias visando a transição energética está sendo literalmente atropelada. Isso ocorre pela presença cada vez maior de empresas estrangeiras que vão assumindo o controle das reservas brasileiras dos minerais estratégicos e essenciais para essas tecnologias.
METAIS ESTRATÉGICOS
Está havendo uma ampliação acelerada das aquisições, feitas por empresas estrangeiras, das reservas brasileiras das matérias primas usadas na indústria de informática, de comunicação e nas baterias de longa duração. Minérios como lítio, níquel e cobalto estão sendo exportados in natura pelas mineradoras que aqui estão se instalando.
A canadense Sigma Lithium acaba de anunciar a primeira leva de exportação de um lote de lítio produzido no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. Foram as primeiras 15 mil toneladas do minério que é cada vez mais usado nos smartphones, computadores, geradores eólicos e baterias para veículos elétricos. A estimativa da Sigma Lithium é de exportar 130 mil toneladas até o final do ano.
O mineral extraído no Vale do Jequitinhonha tem o padrão triplo zero, sem carbono, rejeitos e químicos nocivos. Segundo a Sigma, será o primeiro “lítio verde do mundo”, uma vez que sua produção conta com “zero carbono, zero rejeitos, zero químicos nocivos”, com uso de energia exclusivamente renovável e 100% de água reutilizada.
Entre os minerais extraídos em Minas Gerais, o lítio passou do 11° lugar em faturamento para terceiro colocado, de 2021 a 2023. Os primeiros colocados são os minérios de ferro e de ouro. O Brasil é o 7° maior detentor de reservas de lítio no mundo, com 1,23 milhão de toneladas e, atualmente, é o 5° maior produtor mundial do minério.
BATERIAS ELÉTRICAS
A britânica Atlantic Nickel, integrante do grupo Appian Capital Advisory, produz na Bahia, atualmente, o níquel sulfetado, para abastecimento de mercado de baterias de automóveis em expansão em todo o mundo. O sulfetado possui em sua composição, além do níquel, sulfetos de cobre, cobalto e ferro, assim como alguns metais valiosos (platina, prata e ouro). O sulfetado é o único apropriado para a produção de baterias elétricas.
Pelo valor de R$ 20 milhões, a Companhia Brasileira de Alumínio vendeu a unidade de níquel (mina e usina de concentração) de Niquelândia (GO) para a Wave Nickel Brasil, uma subsidiária controlada da empresa alemã Nickel Wave. Pela venda, a CBA receberá uma parcela inicial de R$ 4 milhões e o restante será pago quando a venda for concluída.
No acordo firmado, a Wave Nickel retomará a produção em Niquelândia, que está paralisada desde 2016 e a CBA fará jus a 3% da receita operacional, a título de royalties, até um valor de US$ 10 milhões por ano. Apesar da venda, a CBA continua responsável pela barragem de rejeitos de Jacuba, que se encontra em processo de descomissionamento.
O empreendimento de Niquelândia iniciou operação em 1981 e, de acordo com a CBA, possui 55 milhões de toneladas de reservas, com 0,94% de níquel e 0,2% de cobalto, tendo capacidade de produzir cerca de 20 mil t/ano de níquel contido em carbonato. Quando a unidade estava em operação, o carbonato de níquel era processado na unidade que a empresa possuía em São Miguel Paulista, que foi vendida para a australiana Jervois Mining.
TRANSIÇÃO ENERGÉTICA
A mineradora Vale fechou acordos com a árabe Manara Minerals e a americana Engine No.1 para vender uma fatia de 13% de sua unidade de metais básicos, a Vale Base Metals Limited (VBM), pelo valor de US$ 3,4 bilhões, informou a companhia na última quinta-feira (27). Os metais desta empresa, são estratégicos para a transição energética, como cobre, níquel, cobalto e lítio, usados em baterias de carros elétricos, sendo que o cobre é utilizado em equipamentos para energia solar e eólica.
O montante total será pago à vista para a Vale Base Metals Limited (VBM), empresa controladora do negócio de Metais para Transição Energética da Vale, na conclusão da transação, sujeita aos ajustes usuais. A Manara Minerals — uma joint venture entre a Ma’aden e o Public Investment Fund (PIF) — deterá 10% da unidade de metais básicos da Vale, enquanto a americana Engine No. 1 ficará com uma participação de 3%, informou a mineradora.
Mais outras três multinacionais estão se instalando em Minas Gerais: a norte-americana Atlas, a australiana Latin Resources e a MG LIT, pertencente à canadense Lithium Ionic. Além disso, a empresa australiana Si6 Metals adquiriu 50% da Foxfire, uma empresa brasileira que comercializa áreas de mineração e detém ativos na região e em outros estados. A Rio Tinto e Vale também estão avaliando projetos na região.
A executiva da Sigma Lithium, Ana Cabral, afirmou que a iniciativa de exportação do lítio “coloca o Brasil como uma referência na cadeia global do lítio”. Referência como exportadora do produto bruto. A empresa canadense espera fornecer, na primeira fase de operação, 270 mil toneladas de lítio verde por ano, o suficiente para abastecer 617 mil carros elétricos. Segundo Cabral, a ideia é triplicar esse número já no ano que vem, chegando a 1,6 milhões de carros.
EXPORTANDO O METAL BRUTO
“O Brasil muda de patamar no setor e passa a ser o novo paradigma global de sustentabilidade socioambiental dentro das cadeias globais de fornecimento de insumos para baterias de veículos elétricos”, reforçou a executiva da multinacional. Na semana passada, o governo de Minas Gerais e a empresa MG LIT, da também canadense Lithium Ionic, firmaram outro protocolo de intenções para exploração de lítio na região no Vale do Jequitinhonha.
O governador de Minas, Romeu Zema (Novo), está comemorando a transformação do Brasil em um mero exportador de lítio e outros metais. O executivo não tem demonstrado empenho nem compromissos com a reindustrialização do país. “A partir de hoje, o Brasil se transforma em um país exportador de lítio, que é o metal da transição energética”, disse Romeu Zema durante o embarque do lítio no porto de Vitória, no Espírito Santo.
Por Sérgio Cruz
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