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O Papel da Bolívia na Geopolítica da América do Sul

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Por Raphael Machado em Café na Política

Esses dias recebemos uma ótima notícia: o ingresso da Bolívia no Mercosul foi aprovado pelo Senado brasileiro e agora depende apenas da ratificação do Lula. A Bolívia tentava entrar no Mercosul desde 2015 e todos os outros países já deram seu aceite.

Para muita gente pode parecer uma notícia menor, pouco relevante geopoliticamente, porque a Bolívia é vista como um país pequeno e pobre, e muita gente está viciada em esquecer o “geo” da geopolítica, a ponto de achar que só países grandes, poderosos e ricos possuem importância geopolítica.

A Bolívia, porém, é geopoliticamente um dos países mais importantes para que o Brasil estruture uma estratégia continental na América do Sul.

Em primeiro lugar, a estatalidade boliviana está indissociavelmente ligado ao Heartland continental. De fato, se retornarmos a Mário Travassos e Golbery Couto e Silva, veremos que mesmo os delineamentos mais estreitos do Heartland abarcam também o norte da Argentina, o noroeste do Paraguai, o oeste do Centro-Oeste brasileiro, parte de Rondônia e do Acre, além do sudeste do Peru. Mas o centro de tudo é a Bolívia e trata-se do único país plenamente integrado no Heartland a ponto de se confundir com ele.

Esses geopolitólogos brasileiros consideravam a Bolívia como o ponto neurológico da América do Sul, a chave para a hegemonia continental.

Em primeiro lugar, a Bolívia encontra-se no eixo dos 3 principais sistemas geográficos do continente: a Bacia Amazônia, a Bacia do Prata (junto ao Chaco) e a Cordilheira dos Andes. É, portanto, um país amazônico, platense e andino. No centro disso tudo, o Altiplano, onde mora a maior parte da população.

O país possui acessos fluviais para o mar através das rimlândias, por exemplo, o Ichilo-Mamoré, que se conecta no rio Amazonas, e o Paraguai-Paraná através de Porto Jennefer. O oposto, portanto, é verdadeiro. A Bolívia é um espaço que dá acesso a quase qualquer parte do continente através de suas conexões fluviais.

Por causa do Altiplano e das Cordilheiras que cercam parte do país, trata-se de uma fortaleza natural. Ao mesmo tempo, o país tem acesso a quase todas as partes do continente com relativa facilidade.

Essa condição da Bolívia é multissecular. O que hoje é a Bolívia foi onde se desenvolveu o Império Tiawanako, território eventualmente absorvido pelo Império Inca e permanecendo foco da resistência inca aos espanhóis por um longo tempo (recorde-se a rebelião de Tupac Amaru II).

É interessante, também, que existe uma continuidade agropecuária entre Santa Cruz de la Sierra e o Centro-Oeste brasileiro, como grandes regiões produtoras de alimentos, o que dá mais uma dimensão estratégica à relação Brasil-Bolívia.

Além disso, é um país rico em gás, petróleo e lítio, este último sendo especialmente estratégico para as transformações industriais contemporâneas, para não falar no boro, zinco, antimônio, ferro, tungstênio, estanho e prata. O país, aliás, é mais industrializado (proporcionalmente) que o Brasil.

Desde 2001, aliás, o país tem tido um crescimento econômico constante, nunca inferior a 2% (exceto 2020, ano da pandemia) e quase sempre acima dos 4%, o que demonstra que Carlos Mesa, Evo Morales e Luis Arce souberam aproveitar todas as vantagens geopolíticas do país.

Ao mesmo tempo, tudo que eu comentei aqui explica o porquê da Bolívia sempre ser alvo de tentativas de revolução colorida, motim, desestabilização, etc.

Uma integração horizontal com a Bolívia, pela construção de ferrovias ligando o Centro-Oeste a Santa Cruz de la Sierra, bem como uma integração vertical de Porto Velho a La Paz, garantiria uma suave integração boliviana ao Brasil, com Brasília devendo, também, estar disposta a proteger os governos bolivianos de intentos de guerra híbrida dirigidos pelos EUA.

Todo ataque à Bolívia deve ser lido como ato preparatório para um ataque ao Brasil.

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