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A Ilusão e a Servidão (3) ou A artimanha bipolar

Adhemar Bahadian

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Há ventos que trazem esperanças . Esta semana, a par dos ventos cúmplices com os incêndios no Brasil, outros ,bem mais notáveis, não devem passar despercebidos. Vejamos.
Começa a cair a ditadura das plataformas digitais. A Europa e os Estados Unidos da América finalmente acordaram para a irresponsabilidade de deixar as plataformas digitais atuarem como entidades supranacionais sem regras nem freios a coibir abusos aos consumidores.

Registre-se a atitude exemplar do Supremo Tribunal Federal brasileiro, hoje óbvia referência dos direitos constitucionais, inclusive do direito de ser informado sem malícia ou anarquismo. Ainda muito bem-vinda a notícia de que a população brasileira rejeita de forma clara os candidatos eleitorais movidos a agressão e ilusionismos.

Finalmente, registro que nos deveria alegrar a todos os índices de crescimento econômico do país, a retomar nossa opção de desenvolvimento com justiça social, de acordo com nosso mandato constitucional.

Feito este preâmbulo, que apenas retrata as correntes positivas que nos impulsionam em direção a um Brasil cada vez mais plural e respeitado, retomo a série que sob o título geral de “a ilusão e a servidão” pretende assinalar os obstáculos ideológicos ao nosso desenvolvimento econômico no período dos anos 60 do século passado até os dias de hoje.

Semana passada assinalei que os anos 80 do século 20, no período do governo Reagan nos Estados Unidos da América, marca, a meu juízo, o ponto nevrálgico da ideologia dominante das negociações econômicas internacionais : neoliberalismo e globalização.

Escolhi começar nos anos 80, no Reganismo , que muito modificou o cenário no pós-guerra, quando os países da Europa e da Ásia já se haviam recuperados da devastação da Segunda Guerra Mundial, em grande parte, por influência do Plano Marshall.

Na mesma quadra histórica ,acentua-se o processo de liberação política dos países colonizados na Afica, em especial, e o fenômeno do subdesenvolvimento passa a ser encarado como um dos maiores desafios da comunidade internacional.

Por volta dos anos 60 do século passado, os Estudos de Raul Prebisch, argentino, e de Celso Furtado, na então Comissão Econômica para a America Latina ( CEPAL), desembocam na criação, na Organização da Nações Unidas, de uma entidade destinada a negociar meios e modos de reduzir, o imenso fosso social e econômico entre os países em desenvolvimento e os desenvolvidos.

O movimento deu à Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento, UNCTAD, na sigla em inglês ,razoável relevância nos anos 60, em grande parte porque expunha igualmente as mazelas deixadas pelos países colonizadores em suas ex-colônias.

Porém, o que mais se evidenciava dos estudos de Prebisch seria a necessidade de se reorganizar o comércio internacional, a fim de permitir que os produtos primários produzidos pelos países em desenvolvimento tivessem melhor remuneração, a fim de permitir que as rendas auferidas por eles contribuíssem para o desenvolvimento industrial das ex-colônias.

Não demorou muito para que os países desenvolvidos se recusassem a aceitar os pleitos trazidos por Prebisch e novas teorias surgiram sempre a enfatizar que o subdesenvolvimento poderia ser “vencido” de forma mais simples sem que atingisse a riqueza e os métodos de trabalho históricos dos países desenvolvidos.

Estamos, como disse, nos primeiros anos da década de 60, quando os movimentos de autonomia política dos países recém libertos assustavam com suas reivindicações o “status-quo ” internacional.

Pouco a pouco, a temática do subdesenvolvimento foi assimilada pelos teóricos da Guerra-Fria e os governos passaram a artificialmente assimilar reivindicações econômicas à eventual defesa de ideologias políticas, em especial polarizando os extremos do capitalismo e do comunismo.

A UNCTAD, desde os seus primeiros meses de funcionamento, foi maliciosamente atacada como pró-comunista e abandonada quase inteiramente pelo Brasil desde os primeiros dias da ditadura militar.

Hoje, é peça histórica de clara evidência do que acima se expôs, o discurso do Presidente Castelo Branco, no Itamaraty, quando condenou o “bifrontismo” inaceitável da Política Externa Brasileira.

Bifrontismo, designação insidiosa a deformar a Política Externa Independente, formulada com o rigor jurídico de San Tiago Dantas e Afonso Arinos de Melo Franco, homens que nem ontem nem hoje podem ser honestamente chamados de comunistas.

Por “bifrontismo” ,condenava-se a prata corrente da Diplomacia de qualquer país, aberta ao diálogo com outras diplomacias independentemente de sua orientação política.

Na prática, “bifrontismo” foi a ideologia que silenciou argumentos em defesa de nosso desenvolvimento econômico, fez de nossos diplomatas homens acuados diante da injúria e da perseguição política. E nos fragilizou diante da arrogância americana.

Esta situação só iria melhorar em meados dos anos 70, quando o Presidente Geisel escolheu como Ministro das Relações Exteriores o Embaixador Antonio Francisco Azeredo da Silveira.

Ao defender uma Diplomacia de “Pragmatismo Responsável” , Silveira não só retirou a mordaça que nos sufocava, mas, de quebra, deu ao Brasil uma Diplomacia respeitável, onde Kissinger, czar da diplomacia americana, jamais recusava atender telefonema de seu contraparte brasileiro a quem chamava de “Dear Antonio”. Sabia com quem estava lidando.

Fica o epitáfio: o bifrontismo matou décadas de soberania política. E foi etapa regressiva na luta contra os desníveis e desencontros de nosso desenvolvimento econômico. Continuarei no próximo domingo.

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EM TEMPO: Desde hoje ,domingo até quarta-feira ,o Brasil será um dos principais países a ser ouvido na Assembleia- Geral das Nações Unidas. Fique atento. Terça-feira Lula abre oficialmente a Assembleia Geral. Depois dele, fala Biden.
2. Dentre tantos diplomatas que pagaram com a cassação de seus direitos civis e políticos por terem defendido a liberdade, quero aqui lembrar o nome de Antonio Houaiss .

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