A derrota democrata nas eleições de 1994 acendeu um alerta que reverbera até hoje. Na época, Robert Reich, então secretário do Trabalho de Bill Clinton, avisou sobre uma “classe ansiosa” de trabalhadores que se sentia abandonada. Esse grupo, formado por pessoas nem tão pobres nem seguras no topo da pirâmide, passou a buscar alternativas que prometessem estabilidade e atenção.
Ao longo das décadas, a economia globalizada impulsionou regiões litorâneas e setores de alta tecnologia. Enquanto isso, muitos polos industriais viram fábricas fecharem e postos de trabalho migrarem para outros países. Apesar de presidentes democratas tentarem ampliar redes de proteção social, como assistência médica e apoio financeiro aos mais carentes, políticas externas e compromissos com grandes doadores acabaram ganhando prioridade.
Esse cenário criou um vácuo de representação. A insatisfação de quem se via sem perspectivas levou a uma busca por discursos mais duros e promessas de retomada econômica imediata. Donald Trump aproveitou essa brecha em 2016, fortalecendo sua base com trabalhadores de colarinho azul [são aqueles que realizam trabalhos manuais ou técnicos, como eletricistas, encanadores, mecânicos, operadores de máquinas e trabalhadores da construção civil]. Sua abordagem direta e pautada no sentimento de injustiça encontrou eco nesses eleitores, que se sentiam esquecidos pelos democratas.
Em 2024, essa dinâmica persistiu. Muitos eleitores em áreas afetadas pelo declínio industrial confirmaram apoio a candidaturas republicanas, movidos pela esperança de políticas comerciais mais restritivas e pelo foco no crescimento interno. A lembrança de promessas não cumpridas e a perda de empregos incentivaram a guinada à direita.
Analistas atribuem esse fenômeno a uma soma de fatores. Houve desconfiança quanto ao compromisso de governos democratas com a proteção do emprego doméstico. Também pesaram iniciativas de integração internacional que abriram mercados, mas nem sempre protegeram as regiões menos preparadas para competir globalmente.
O Blog do Esmael observa que esse alerta de Reich, ignorado por décadas nos Estados Unidos, encontra paralelo no “rancor” do eleitor brasileiro. Nas eleições de 2024, parte do público mostrou insatisfação com políticos tradicionais e flertou com a extrema direita. Em cidades como São Paulo e Curitiba, candidatos radicais chegaram ao segundo turno.
Os extremistas Cristina Graeml (Curitiba) e Pablo Marçal (São Paulo), nas eleições municipais de 2024, foram a expressão maior do rancor dos eleitores com políticos tradicionais no Brasil.
Foi necessária uma força-tarefa entre centro-direita e centro-esquerda para impedir um resultado ainda mais extremo nessas capitais.
O desafio, tanto nos EUA quanto aqui, no Brasil, é reconquistar a confiança de uma classe trabalhadora que se sente desamparada, dando voz às demandas de quem, até então, se via esquecido.
Publicação original em: https://www.esmaelmorais.com.br/por-que-os-democratas-perderam-a-classe-trabalhadora-nos-eua/