“Você mudou o nome de Elon Musk para Leon Musk.
Por quê?”
Essa pergunta me foi feita por um admirável botafoguense esta semana.
Mas não foi só isso.
A epígrafe no artigo não é de Musk, mas de outro Leon.
Que comandou outro exército vermelho que não o de weaponized autists a serviço de MAGA.
Três passagens (que estão nas páginas 104 a 106, e, desculpe querida leitora, vou transcrever um trecho longo) de um interessante livro do Zizek, Like a Thief on Broad Daylight, de antes do ano da Covid e da guerra na Ucrânia provocarem um descarrilhamento de suas ideias:
“Trotsky thus targeted the material (technical) grid of power (railways, electricity, water supply, post, etc.), the grid without which state power hands in the void and becomes inoperative.
Let the mobilized masses fight the police and storm the Winter Palace (an act without any real relevance): the essential move is accomplished by a tiny, dedicated minority…”
“And, in the same way that Trotsky required the mobilization of a tight, disciplined ‘storming party’, technical experts and gangs of armed men led by engineers’ to resolve this ‘question of technique’, the lesson of the last decades is that neither massive grass-roots protests (as we have seen in Spain and Greece) nor well-organized political movements (parties with elaborated political visions) are enough – we also need a narrow, striking force of dedicated ‘engineers’ (hackers, whistle-blowers…) organized as a disciplined conspiratorial group.
Its task will be to ‘take over’ the digital grid, to rip it out of the hands of the corporations and state agencies that now de facto control it.”
“We need thus the political equivalent of the Hegelian triad of the universal, the particular, and the singular.
Universal: a mass upheaval, Podemos style. Particular: a political organization that can translate the dissatisfaction into an operative political programme.
Singular: ‘elitist’ specialized groups which, acting in a purely technical way, undermine the functioning of state control and regulation.
Without this third element, the first two remain impotent.”
Não dá para entender o que se passa nos EUA se não se entender que esta tomada de poder é, em muitos sentidos, uma tomada revolucionária.
Se é uma tomada revolucionária que parece apenas reacionária (e ela é reacionária em muitos sentidos) para a maioria das pessoas da esquerda, é porque essas pessoas não querem entender o quão capturada foi a revolta delas pelo tipo de establishment que se configurou no Ocidente, de Obama entre o momento em que ele explicou aos banqueiros que “My administration is the only thing between you and the pitchforks” e o regime sendo hoje desmascarado com o fim (ainda em curso) da USAID e da NED.
Quando escrevi uns anos atrás que as Paradas LGBT+ eram a nova Marcha da Família com Deus pela Liberdade, não é só porque o que um dia foi algo revolucionário se tornou ferramenta corporativa.
Fora do Ocidente isso ainda é algo disruptivo, e, como tal, foi instrumentalizado recentemente na revolução colorida em Bangladesh (o dado curioso é que apoiados pelo lado mais homofóbico do uniparty americano).
Universal: o trumpismo global, a revolta populista da pequena burguesia, do proletariado, e do mundo local, contra a globalização/neoliberalismo.
Particular: as redes de diálogo/comunicação operando dentro das redes sociais, fora dos espaços políticos e corporativos clássicos, descolando a base do Partido Republicano dos apitos pavlovianos clássicos da política americana.
Singular: muito mais que o Projeto 2025, o DOGE.
Quando me despedi do VÍNCULO, início de 2021, escrevi sobre a professional managerial class, sobre os problemas da minha classe.
Grande parte dos meus amigos olha para os EUA hoje com os olhos de solidariedade de classe.
Sentem na própria carne a dor, como se bolsonaristas a estivessem infligindo neles.
O olhar deveria ser outro: um olhar de alerta.
Um olhar de entender como determinadas mudanças se manifestam, que o mundo não gira: capota.
Uma capotagem que há pela frente, suspeito, já reflete a aleteia que vem por aí das ações americanas de Obama para cá: o barraco Moro-Mário Frias.
Sabe aquele alerta feito na imprensa alternativa de que o Departamento de Justiça americano estava por trás da Lava Jato?
Pois é, agora isso é bem capaz de vir a público com detalhes, mas com a inconveniência, para quem quer alinhar com o discurso de direita importado dos EUA, que é o fato de que isso legitimou um golpe contra a esquerda o Brasil.
O problema, problema mesmo, vai ser se isso respingar para esferas mais altas que Curitiba e o TRF-4.
Afinal, esses são os heróis de nossa soberania no momento.
Mas parte da direita bolsonarista se desvincula desses “heróis” jurídicos da luta anticorrupção.
O passo seguinte, suspeito, vai ser cair a ficha de que eles podem se desvincular de Bolsonaro e de seus filhos, se desvincular também do aparato do EB que tem o governador Tarcísio como a ponta “civilizada”.
O podcast em que os “bárbaros” Marçal e Boulos conversaram civilizadamente entre os turnos da eleição para prefeito, eleição na qual os dois foram derrotados (mas não necessariamente perderam), é um sintoma de possibilidades de futuro de nossa política, goste-se ou não disso.
No mais, os nomes polêmicos indicados por Trump para o governo vão sendo aprovados.
Mais realidades estilhaçadas vêm pela frente.
Original em: https://www.afbndes.org.br/vinculo/opiniao/talvez-uma-revolucao-por-paulo-moreira-franco/