Em 4 de abril de 2025, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou de forma espalhafatosa a imposição de tarifas sobre importações provenientes de 57 parceiros comerciais.
Justificadas como uma tentativa de corrigir déficits comerciais crônicos, essas medidas não apenas agravaram a instabilidade dos já voláteis mercados globais, como também desencadearam uma série de retaliações que se revelaram economicamente onerosas para os próprios Estados Unidos.
Esse evento, longe de ser algo pontual, faz parte de uma escalada de animosidades comerciais e diplomáticas que vêm marcando o cenário internacional desde o retorno de Trump ao poder.
Sob a retórica de “America First“, o governo norte-americano tem optado por uma postura cada vez mais confrontadora, expondo a fragilidade do sistema de governança global e contribuiu para um ambiente de incerteza e desconfiança mútua.
Nesse contexto, o Canadá, tradicional aliado e parceiro comercial dos Estados Unidos, não ficou isento, contrariando sua tradição de neutralidade.
O artigo do Financial Times, intitulado “Ontario hits power exports to US with 25% surcharge as trade war escalates“, detalha como a província de Ontário planejou um aumento nas tarifas sobre as exportações de eletricidade para os estados de Nova York, Michigan e Minnesota, impactando aproximadamente 1,5 milhão de residências e empresas estadunidenses.
A medida havia sido projetada, antes mesmo do “tarifaço de Trump”, para gerar entre 208 mil e 277 mil dólares por dia, com o objetivo de proteger os interesses econômicos da província e enviar uma mensagem clara ao governo dos Estados Unidos.
O que antes estava restrito às planilhas e às simulações técnicas passou a integrar, pela força dos fatos e pela irresponsabilidade das relações exteriores conduzidas pelo atual ocupante do Salão Oval, a realidade concreta da geopolítica energética nos EUA.
A decisão de Ontário reflete uma estratégia calculada de retaliação, mirando setores sensíveis da economia americana.
A interdependência energética entre Canadá e EUA é profunda, com várias regiões americanas dependendo significativamente da eletricidade canadense.
Ao aumentar as tarifas sobre essas exportações, Ontário não apenas busca compensar as perdas impostas pelas tarifas americanas, mas também destacar as vulnerabilidades criadas por políticas comerciais agressivas e unilaterais.
Esse acirramento nas tensões comerciais evidencia com clareza os riscos civilizatórios de se entregar a condução de uma potência econômica global a um mandatário que despreza frontalmente a ciência econômica, os princípios elementares da diplomacia e os consensos mínimos que sustentam o comércio internacional.
Ao tomar decisões de impacto global com base em impulsos nacionalistas e ressentimentos eleitorais, Donald Trump reforça um projeto de poder que não se apoia na razão, mas na performance do confronto, no ilusionismo da força bruta e na manipulação de um eleitorado mal informado, seduzido por promessas de uma prosperidade que já não existe nos termos do século passado.
A imposição de tarifas por parte dos Estados Unidos e as contramedidas adotadas pelo Canadá ilustram os perigos de políticas comerciais unilaterais e a importância de preservar relações comerciais baseadas em respeito mútuo e cooperação.
O “garrote canadense” aplicado em resposta às ações do “touro velho” evidencia que, em um mundo interconectado, ações isolacionistas podem ter repercussões amplas e inesperadas.
É nos detalhes dessas reações calculadas que se revela o verdadeiro contraste entre estadismo e populismo.
Ontário não gritou.
Apertou.
E ao apertar, mostrou que maturidade diplomática se exerce com firmeza silenciosa cirúrgica.
O problema maior, portanto, não é que Trump ignore as regras da economia global, mas que milhões o aplaudam justamente por isso.
Nesse cenário, não é o protecionismo que ameaça o equilíbrio internacional, mas a celebração da ignorância como projeto de poder.
E quanto mais se aplaude a verborragia irresponsável acompanhada de atos estapafúrdios, mais valor ganha o gesto calculado de quem, com precisão, aperta o garrote.