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A economia chinesa enfrenta o império neoliberal

Por Rodrigo Medeiros*.

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Logo após a escalada da guerra tarifária promovida pelo presidente norte-americano Donald Trump, muitos analistas destacaram o profissionalismo e a inteligência diplomática chinesa na articulação de respostas aos ataques sofridos.

Afinal, como a China se tornou a potência que pode criar dificuldades para o exercício unilateral da hegemonia norte-americana em agonia?

O livro ‘Como a China escapou da terapia de choque’, de Isabella Weber, editado pela Boitempo, em 2023, traz informações e análises que nos ajudam a entender como aquele país se fortaleceu ao longo dos anos, principalmente a partir dos anos 1980.

Segundo Weber, “no fim da década de 1970 e ao longo da década de 1980, a questão de como recriar a economia e os mercados tornou-se decisiva”.

As “experiências de guerra”, destacou a professora da Universidade de Massachusetts Amherst, foram cruciais em termos do aprendizado político, pois a economia chinesa havia falhado então em garantir bens de consumo para a sua população.

Entre os arquitetos das reformas, “o pensamento econômico foi moldado pela experiência de planejamento das bases materiais na guerra de libertação”.

Chen Yun, por exemplo, é conhecido como um dos principais arquitetos das reformas econômicas ocorridas entre o fim dos anos 1970 e o início dos anos 1980.

Ele defendeu que o progresso econômico era fundamental para a revolução porque era importante resolver os problemas dos alimentos e do vestuário para a população chinesa.

O objetivo dos reformistas era criar um “mercado socialista organizado”.

Desafios da inflação se apresentaram para os reformistas chineses.

Conforme ponderou Weber, “em vez de recorrer à pressão política e ao poder de policiamento para conter diretamente os preços de mercado, a liderança controlava indiretamente os preços, reanimando e canalizando as forças do mercado, não tentando suprimi-las”.

A estratégia chinesa consistiu em ter liderança sobre os preços dos bens de consumo essenciais.

“O controle da inflação em uma economia agrária e pobre, visando o rápido crescimento econômico e à industrialização”, de acordo com a professora, “foi alcançado, em parte, pela supressão das necessidades de consumo da maioria camponesa da China”.

Houve custos sociais.

No seu discurso de 1978, Deng Xiaoping falou sobre os objetivos da China: “livrar nosso país da pobreza e do atraso, alcançar – ou mesmo superar – os países avançados”.

Deng defendeu uma visão mais meritocrática e menos igualitária em relação ao período maoísta.

As reformas seguiam a lógica de Lênin: “quanto menos desenvolvido o país, mais difícil é a transição do capitalismo para o socialismo”.

As “Quatro Modernizações” foram um conjunto de reformas econômicas propostas por Deng Xiaoping na China a partir do final da década de 1970, com o objetivo de modernizar e fortalecer o país após o período da Revolução Cultural.

Elas foram fundamentais para transformar a economia chinesa e abrir caminho para o crescimento acelerado das décadas seguintes.

As quatro áreas visadas pelas modernizações foram: 1) Agricultura – incentivo à produtividade e à eficiência no campo, reduzindo o controle estatal rígido; 2) Indústria – incentivo à produção de bens de consumo e modernização das fábricas; 3) Ciência e Tecnologia – valorização da educação e da pesquisa científica; 4) Defesa Nacional – modernização com tecnologia mais avançada.

O foco principal foi no desenvolvimento econômico e tecnológico nacional.

Deng Xiaoping deixou claro, em abril de 1979, que “desenvolver uma economia de mercado não significa praticar o capitalismo”.

Ele completou então afirmando que “estamos introduzindo uma economia de mercado, mas é uma economia socialista de mercado”.

O neoliberalismo não teve espaço político na China, que se industrializou, sofisticou tecnologicamente e se fortaleceu como nação, diferentemente do que ocorreu nos países da América Latina nos últimos quarenta anos.

Os chineses não desnacionalizaram a economia e tampouco promoveram a abertura da conta de capitais.

Eles mantiveram um controle rigoroso sobre os fluxos financeiros internacionais, embora tenham feito algumas liberalizações graduais.

Para quem quiser colocar uma maior ênfase analítica nas “questões democráticas” como algo deficitário ou problemático para o caso chinês, precisamos lembrar que novas formas de fascismo estão ameaçando as democracias liberais em nosso tempo.

A oligarquização das democracias liberais, comandadas por plutocratas que empobreceram os seus compatriotas, é visível nos Estados Unidos da América, o farol de inspiração do neoliberalismo brasileiro.

O capitalismo é o regime do capital, que, sem um contraponto como alternativa real de organização econômica, demonstrou que não se preocupa com o bem-estar social.

Em tempo, lamento a morte do papa Francisco, que denunciou as desigualdades sociais e a destruição da natureza, alinhando as suas ações e os seus ensinamentos com os princípios da justiça social, da opção preferencial pelos pobres e da crítica ao sistema econômico injusto.

Em ‘Evangelii Gaudium’ (2013), Francisco condenou a economia da exclusão e a “cultura do descarte”, afirmando que o dinheiro deve “servir, não governar”.

Ele criticou a especulação financeira e os paraísos fiscais, chamando-os de estruturas de pecado que aprofundam a desigualdade.

Ademais, Francisco apoiou cooperativas e economias solidárias, encontrando-se com líderes de movimentos populares e defendendo o trabalho digno e a terra para os pobres.

Rodrigo Medeiros é professor do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes) e editor da Revista Interdisciplinar de Pesquisas Aplicadas (Rinterpap).

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