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O Ciclo Estrutural da Pobreza no Brasil: Rupturas Históricas e Desafios Futuros

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O Brasil nasceu sob a lógica da exploração em um ambiente configurado pela monocultura, pela escravidão e a concentração fundiária.

Nesse ambiente, a abolição da escravidão, decretada em 1888, não foi acompanhada de políticas de reparação ou inclusão social e, dessa forma, a República Velha apenas fez (na sua estrutura) a substituição de senhores por coronéis.

Depois disso, ao longo do século XX, mesmo nos momentos de crescimento econômico, a riqueza (coletivamente produzida) sempre continuou a ser apropriada por poucos e a pobreza a ser tratada como “efeito colateral” do progresso – nunca como prioridade política.

Em síntese, no Brasil, a desigualdade gera pobreza, e a pobreza, pela falta de acesso a oportunidades reais, continua a reforçar a desigualdade até os dias atuais:

  • Ou seja, no nosso país a pobreza não é um fenômeno isolado ou circunstancial;
  • Ela é estruturalmente forjada desde a colonização e perpetuada por séculos de exclusão;
  • E, dessa forma, mantida por políticas econômicas que priorizam o capital sobre o trabalho, se estabelece um ciclo que se retroalimenta continuamente.

Apesar disso, importantes tentativas de rupturas históricas com esse ciclo estrutural da pobreza não podem ser desconsideradas e indicam que a condição da pobreza no Brasil não é imutável e depende claramente de decisão política.

A Era Vargas e o Trabalhismo Nacional-Desenvolvimentista (1930–1954) destaca-se por ser a primeira iniciativa significativa nesse sentido, quando o Estado passou a intervir na economia e reconhecer os direitos dos trabalhadores urbanos:

  • Vargas enxergava o trabalhador como sujeito de direitos e o Estado como promotor da justiça social;
  • Assim, a CLT, a criação da Petrobras e a expansão da indústria nacional marcaram um novo modelo de desenvolvimento com soberania e inclusão, instituído a partir daí.

A Constituição de 1988, colocando a cidadania como base para a consolidação de um pacto social amplo, universalizou o acesso à saúde, fortaleceu a previdência e outros direitos sociais, e:

  • Apesar das limitações fiscais e institucionais, plantou as sementes de uma sociedade mais justa;
  • Representou um marco civilizatório, criando os recentes fundamentos de um Estado de bem-estar no Brasil.

Por último, no período (2003–2014), um novo o ciclo de inclusão social foi estabelecido – a partir das ascensão do Partido dos Trabalhadores (PT) ao poder e a chegada de Lula à Presidência da República:

  • O combate à pobreza foi o eixo de um projeto de governo cujo aumento real do salário mínimo e os programas de transferência de renda, junto ao estímulo à formalização e o acesso ao crédito popular tiraram milhões da miséria;
  • A pobreza caiu de 38% da população, em 2003, para menos de 15% em 2014, segundo dados da PNAD (Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios).

Mas, de forma avassaladora com a ofensiva neoliberal (pós golpe de 2016), ocorreu um alarmante retorno da pobreza, em curso ascendente outra vez no país.

O golpe de 2016 marcou o início de um novo ciclo de exclusão:

  • A agenda neoliberal, com congelamento de gastos sociais e implementação de reformas que retiraram direitos;
  • Destruiu importantes mecanismos de inclusão, atacando principalmente o legado Varguista e desmontando as políticas públicas de combate à pobreza instituídas pelo PT.

Mesmo após a volta de Lula ao poder, em 2022, o rentismo continua ditando as regras no Brasil:

  • A manutenção da taxa Selic em níveis altíssimos, mesmo com inflação controlada, transfere bilhões dos cofres públicos para rentistas e fundos financeiros;
  • Isso paralisa investimentos, encarece o crédito produtivo e inviabiliza políticas sociais;
  • A austeridade fiscal virou sinônimo de abandono social e, enquanto o Brasil destina mais de R$700 bilhões anuais ao pagamento de juros de uma dívida irreal e não auditada, a população pobre vê escolas e postos de saúde sucateados e as possibilidades de um futuro promissor perdidas.

O atual governo vem estabelecendo esforços para retomar a agenda social: relançou o Bolsa Família com foco na infância, valorizou o salário mínimo acima da inflação e reativou o PAC focado na reindustrialização e geração de empregos – e os dados atuais já indicam uma diminuição (ainda que incipiente) na situação de pobreza e extrema pobreza no Brasil.

Mas é preciso ir além:

  • Enfrentar o poder do rentismo e revisar o regime de metas de inflação, que concentra poder no Banco Central independente e não estabelece vínculo com qualquer objetivo social;
  • Aprovar uma reforma tributária progressiva, taxando os super-ricos e desonerando o consumo dos mais pobres;
  • Reduzir estruturalmente a taxa de juros para liberar o orçamento  para que o governo possa investir onde, quando e como precisa, de acordo com os interesses do país e as reais necessidades do povo –  tais como educação, saúde, infraestrutura e serviços públicos de qualidade.

Enfim, o ciclo da pobreza no Brasil é estrutural, mas não imutável. Vargas rompeu com a ordem oligárquica subserviente, preconizando desenvolvimento com soberania e inclusão; a Constituição de 88 fundamentou importantes direitos sociais e cidadania; e Lula mostrou que é possível incluir os pobres no orçamento sem sacrificar a estabilidade econômica:

  • Restando claro que o maior obstáculo para quebrar o perverso ciclo da pobreza não é técnico;
  • É preciso romper com o neoliberalismo e com a lógica financeira que coloca os lucros acima das vidas.

Não há justiça sem equidade, nem futuro sem dignidade. O fim da pobreza no Brasil não é utopia — é uma questão de decisão política — Ou seguimos reféns da lógica financeira que lucra com a miséria, ou escolhemos, de fato, construir um país onde viver com dignidade seja um direito de todos, e não um privilégio.

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