Karl Marx, que neste 5 de maio completa 255 anos de sua morte, pregou que a primeira grande luta operária libertadora do trabalho diante do capital que o explora é pela redução da jornada de trabalho. Quanto menor a jornada, mais o trabalhador tem disponibilidade para debater as suas condições objetivas como classe social destinada a lutar contra o capitalista que o explora.
Certamente, estaria na linha de frente da luta dos trabalhadores brasileiros, no momento, para redução a jornada de trabalho 6×1 por uma de 4×3, enquanto a burguesia resiste até a de 5×3, que o governo aceita discutir.
Marx foi, essencialmente, revolucionário empenhado em elaborar programa político para atuação dos trabalhadores se emanciparem diante dos seus exploradores.
Por isso, a libertação do trabalho diante do capital deve, segundo ele, ser obra dos próprios trabalhadores, tomando consciência de sua condição de classe destinada a derrotar o capitalismo para instaurar o socialismo, no qual a luta entre capital e trabalho se encerraria, para criar uma nova sociedade.
Para esse programa político capaz de emancipar o trabalhador, por meio da luta de classe, Marx escreveu com Engels, o Manifesto do Partido Comunista, no final de 1847, início de 1848, quando as tensões econômicas, na Europa, acirram as contradições de classe entre capital e trabalho.
No Manifesto Comunista, Marx e Engels, traça um decálogo de trabalho, para orientar a ação política dos partidos socialistas e comunistas que estavam surgindo na Europa, para lutar contra os capitalistas, organizados em sistemas políticos dominados pelo capital, cuja base de multiplicação se dá pela exploração máxima dos trabalhadores, no prolongamento das jornadas de trabalho.
Nas fábricas, onde avançava a indústria, as jornadas se esticavam para além das 14 horas diárias, estendendo-se, normalmente, às 16, 18 horas, até 20.
Não se excluíam nem mulheres nem crianças, num regime de exploração infernal, de modo que o primeiro objetivo da luta marxista mirou na redução da jornada.
REDUÇÃO DA JORNALDA AUMENTA SALÁRIO
Diminuindo a jornada, no cenário em que a divisão do trabalho se transforma na característica principal do desenvolvimento do capitalismo, voltado à produção de mercadorias, objetivando o lucro, haveria, segundo Marx e Engels, aumento de oferta de trabalho e de salários, enquanto os trabalhadores, simultaneamente, organizavam-se como classe para a luta política por meio dos sindicatos e partidos dos trabalhadores, como instrumentos ideológicos essenciais às mudanças.
Os dois mais importantes defensores dos trabalhadores, em seu tempo, Marx e Engels, convocados pelos líderes sindicais, prepararam o Manifesto Comunista, como arma essencial para a luta, que se desenrola até hoje, enquanto durar o capitalismo como modo de produção, a partir do domínio da propriedade privada dos meios de produção, no lugar da propriedade coletiva, que caracteriza a propriedade socialista.
Os dez pontos fundamentais do Manifesto marxista são:
1 – Expropriação da propriedade latifundiária e utilização da renda da terra para cobrir despesas do Estado;
2 – Imposto fortemente progressivo;
3 – Abolição do direito de herança;
4 – Confisco da propriedade de todos os emigrados e sediciosos;
5 – Centralização do crédito nas mãos do Estado, através de um banco nacional com capital estatal e monopólio exclusivo;
6 – Centralização do sistema de transportes nas mãos do Estado;
7 – Multiplicação das fábricas e dos instrumentos de produção pertencentes ao Estado, desbravamento das terras incultas e melhora das terras cultivadas segundo um plano geral;
8 – Trabalho obrigatório para todos, constituição de brigadas industriais, especialmente para a agricultura;
9 – organização conjunta da agricultura e da indústria, com o objetivo de suprimir paultatinamente a diferença entre cidade e campo, e;
10 – Educação pública e gratuita para todas as crianças. Supressão do trabalho fabril de crianças, tal como praticado hoje (na primeira metade do século 19). Integração da educação com a produção material etc.
Para Marx, “uma vez que, no processo, desapareçam as diferenças de classe e toda a produção esteja concentrada nas mãos dos indivíduos associados, o poder público perderá seu caráter político”.
Mais: “O poder político propriamente dito, segundo Marx, é o poder organizado de uma classe para dominar outra. Se, em sua luta contra a burguesia, o proletariado[hoje, precariado, na economia digital dos aplicativos], necessariamente, se constitui em classe, se por meio de uma revolução se converte em classe dominante e, como tal, suprime violentamente as velhas relações de produção, então, junto com elas, suprime os antagonismos de classes e as classes em geral e, com isso, abole sua própria dominação de classe”.
E conclui: “No lugar da velha sociedade burguesa, com suas classes e seus antagonismos de classe, surge uma associação em que o livre desenvolvimento de cada um é o pressuposto para o livre desenvolvimento de todos.”
No mundo atual, quem está colocando em prática os mandamentos de Marx é a China, que fez sua revolução operária em 1949, liderada por Mao Tse Tung, cuja determinação é o comando político orientado pelo Estado, sob organização de planejamento do partido comunista, razão pela qual passou a dominar a economia, ultrapassando a hegemonia capitalista americana.
LULA CONTRA A JORNADA 6X1
A economia vai, relativamente, bem, segundo dados oficiais, mas o trabalhador vai mal com a jornada 6×1 na escalada neoliberal antinacionalista antissocial.
Por isso, o Planalto muda o discurso para atender a principal reivindicação dos trabalhadores, por escala 4×3, que setores do governo julgam conveniente seja 5×2, para ser mais palatável a um Congresso conservador, aliado das forças do capital contra as do trabalho.
Embora o discurso neoliberal, amplamente divulgado pela mídia pró- 6×1, predomine entre os capitalistas, favorecidos pela reforma trabalhista, com o golpe político de 2016, a mobilização dos trabalhadores demonstra a insatisfação da categoria contra a supressão dos direitos sociais e trabalhistas.
Por isso, empurram o governo para uma posição progressista.
Há, portanto, um racha dentro das forças governistas: os que propõem posição mais radical, favorável à jornada 4×3, de um lado, e, de outro, os que consideram, politicamente, mais adequado a escala 5×2.
O fato é que depois das eleições municipais de 2024, o quadro político trabalhista, do ponto de vista da luta dos trabalhadores, mudou, qualitativamente, no cenário do arcabouço fiscal neoliberal.
O que não dá mais para defender é a escala 6×1, que joga a classe trabalhadora contra o governo, se ele insistir nela, sob pressão empresarial, pois, aí, perderia eleição.
Os trabalhadores, de fato, ao insistirem em posição mais avançada, demonstram que têm consciência de que a reforma trabalhista veio para prejudica-los, revertendo o argumento conservador neoliberal de que eles concordam com as mudanças na legislação para fazer valer o espírito empreendedor, que tira direito trabalhista em favor da flexibilização da carga horária.
Uma farsa.
SUPEREXPLORAÇÃO DO TRABALHO CONTINUA
O trabalhador faria a sua escala de trabalho, adquirindo maior liberdade de mobilização, embora essa nova caracterização da jornada exclua qualquer tipo de direito adicional como vantagem trabalhista.
Os trabalhadores, na verdade, querem conjugar liberdade para fazer seu horário de trabalho, sem perder direitos, mas ganhando vantagens com nova segurança trabalhista, o que ainda não se configura no universo do trabalho como direito compensatório à eliminação dos direitos intrínsecos à Consolidação das Leis do Trabalho, implantada pelo nacionalismo varguista, depois da Revolução de 1930.
A ministra Articulação Social, Gleisi Hoffmann, que coordena a negociação com os trabalhadores, argumenta que estes querem novas garantias trabalhistas, mas não adianta qual a essência desta garantia, além da conquista que ocorreria se a jornada 6×1 fosse imediatamente superada.
Há, na verdade, uma descoordenação geral na relação governo-trabalhadores.
Quanto mais o assunto se politiza e polariza, capital x trabalho, mas o tema tende a ganhar predominância no debate para ter ampla repercussão da sucessão presidencial.
O presidente Lula animou o debate do assunto no seu discurso de Primeiro de Maio, mas as providências objetivas ainda estão para ser construídas.
A emancipação dos trabalhadores, na prática, não viria da boa vontade do governo, dominado pelo capital financeiro especulativo, no cenário da financeirização econômica, mas por obra da organização dos próprios trabalhadores em sua tarefa emancipadora.
Esse, certamente, é assunto que, com a reforma neoliberal, deixou de ser animado na vida dos sindicatos, que perderam força política, com a supressão do imposto sindical, que dava ampla mobilidade à ação sindical para fortalecer posições dos trabalhadores.
Sem o imposto sindical, as lideranças sindicais não têm força política suficiente de mobilização, para pressionar o Congresso Nacional, onde o debate está, praticamente, morto pela orientação dominante da maioria congressual conservadora pró-neoliberalismo.
O teste decisivo, portanto, será até que ponto os trabalhadores, em situação super-precarizada, conseguirão dar a volta por cima, para reverter o status quo neoliberal que favorece amplamente o capital frente ao trabalho no cenário em que a queda dos salários se acentua, para manter elevada e constante a taxa de lucro dos capitalistas, como compensação pela insuficiência de demanda crescente dos trabalhadores.