A explosão das apostas online no Brasil revela uma face cruel do capitalismo digital desregulado — o uso da tecnologia e do marketing para explorar a vulnerabilidade humana e aprofundar desigualdades sociais:
- O que se vende como entretenimento, diversão ou oportunidade de enriquecimento rápido;
- Na prática tem destruído vidas, endividado famílias e corroído as bases sociais já fragilizadas do país.
Segundo o Procon-SP, quase metade dos apostadores já comprometeu boa parte da sua renda com apostas:
- Muitos sacam suas economias ou se endividam tentando recuperar perdas;
- Sendo ainda mais grave os indícios de que beneficiários do Bolsa Família estão utilizando recursos do programa para apostar — o que revela o grau de penetração desse vício entre os mais pobres.
Transtornos como ansiedade, depressão e até suicídio estão se tornando mais frequentes e essa realidade não acontece por acaso:
- As apostas online são impulsionadas por publicidade agressiva, muitas vezes protagonizada por celebridades e influenciadores digitais que falam diretamente aos jovens das periferias, prometendo lucros fáceis e vidas de ostentação;
- Os dados mostram que 46% dos apostadores têm entre 19 e 29 anos e 34% pertencem às classes C, D e E — um terço dos quais já estão negativados.
Não se trata, portanto, de um problema individual, mas de uma política de omissão diante de um mercado bilionário que cresce à custa da miséria alheia e tem gerado uma situação desesperadora, na qual o vício em apostas não é apenas apenas uma questão financeira – mas sim um grave problema de saúde pública.
O ciclo vicioso destrói lares entre apostadores compulsivos, compromete a produtividade e amplia o fosso da desigualdade no Brasil:
- Estima-se que os brasileiros gastaram R$12 bilhões em apostas em 2023;
- Um valor que, em vez de fomentar consumo produtivo ou poupança, é drenado para o exterior ou para grandes conglomerados privados que pouco retornam à sociedade.
O Brasil precisa enfrentar esse problema com seriedade.
A proibição do uso de cartões de crédito para apostas é um avanço, mas insuficiente:
- É preciso regulamentar com rigor esse setor, limitar sua publicidade;
- Proteger os vulneráveis;
- E tributar fortemente essa atividade que gera lucros astronômicos à custa do sofrimento popular.
As plataformas de apostas são a versão digital do “cada um por si” neoliberal: sem proteção, sem regulação, sem ética.
Mais do que uma questão moral ou regulatória, o fenômeno das apostas online é expressão direta do modelo neoliberal que dominou o país nas últimas décadas:
- Um modelo que idolatra o mercado;
- Desmonta o Estado e transfere para o indivíduo a responsabilidade por seu sucesso ou fracasso, mesmo quando ele é alvo de estruturas pensadas exclusivamente para explorá-lo.
A aposta como promessa de ascensão social imediata nada mais é do que a falência da ideia de mobilidade via trabalho, educação e cidadania.
Apostar na destruição de vidas não pode estar inserido no modelo de desenvolvimento de um país que se pretende justo, soberano e democrático.
Quando a esperança se resume a um clique, é porque o Estado abdicou de seu papel civilizatório e entregou a dignidade humana à lógica da roleta. Enquanto isso não for enfrentado, seguiremos testemunhando um ciclo perverso: o da miséria explorada como negócio.