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Ponha-se no seu lugar, senador! Por Luiz Henrique Lima Faria

Luiz Henrique Lima Faria – Professor do Instituto Federal do Espírito Santo (IFES) e Editor-Chefe da Revista Interdisciplinar de Pesquisas Aplicadas (RINTERPAP).

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Durante uma audiência na Comissão de Infraestrutura do Senado, no dia 27 de maio de 2025, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, foi interpelada de forma grosseira pelo senador Marcos Rogério, do PL de Rondônia, que presidia a sessão.

A discussão girava em torno da criação de unidades de conservação na Margem Equatorial, mas o debate técnico cedeu espaço a ataques pessoais e tentativas explícitas de silenciamento.

O senador disse à ministra que ela deveria “se colocar no seu lugar”, como se houvesse um lugar predefinido para mulheres na política, um lugar de subalternidade, submissão ou silêncio.

Marina, com a altivez que lhe é própria, respondeu com firmeza: “Não sou uma mulher submissa”.

E, diante da escalada de desrespeito, retirou-se da sessão afirmando ter sido agredida no exercício legítimo de sua função ministerial.

Mais do que um episódio isolado, o que se viu naquela audiência foi a reafirmação de uma prática política contaminada pela misoginia.

Esse tipo de conduta não é acidental nem um caso isolado quando se observa o comportamento sistemático de políticos da extrema direita ao redor do mundo.

A cientista política norte-americana Cynthia Miller-Idriss, em sua obra Hate in the Homeland: The New Global Far Right (2020), demonstra que a misoginia não constitui um desvio, mas sim um pilar central, tanto ideológico quanto afetivo, das novas direitas radicais em múltiplos contextos globais.

Ela atua como instrumento de coesão identitária e mobilização política, articulando o rechaço ao feminismo à defesa de uma ordem social rigidamente hierarquizada, que relega às mulheres as posições mais subalternas.

Ainda, segundo Miller-Idriss, o ódio às mulheres não aparece de forma marginal, mas é deliberadamente cultivado em discursos, políticas e práticas que associam o feminismo à decadência moral da sociedade, atacam direitos reprodutivos, exaltam papéis tradicionais de gênero e projetam nas mulheres emancipada uma ameaça à ordem estabelecida.

A misoginia, nesse campo, é pedagógica: ensina quem deve ocupar os espaços de poder e quem deve ser silenciado.

No Brasil, essa lógica se manifesta na tentativa recorrente de desqualificar mulheres públicas, especialmente aquelas com trajetórias autônomas e posições firmes.

Marina Silva, por sua origem popular, compromisso ambiental e atuação política pautada pela ética e pela sensibilidade, tornou-se alvo preferencial dessa violência simbólica.

Como analisa Flávia Biroli em Gênero e desigualdades: limites da democracia no Brasil (2018), mulheres que ocupam espaços de poder de forma crítica e independente ameaçam estruturas que naturalizam a exclusão.

Para setores conservadores, essas presenças devem ser não apenas minoritárias, mas disciplinadas e quando não o são, são tratadas com escárnio e hostilidade.

Essa violência se materializa em cortes de orçamento para políticas de proteção, na obstrução de agendas feministas e no silenciamento deliberado de lideranças.

Como observa Djamila Ribeiro em O que é lugar de fala? (2019), negar a legitimidade da fala de mulheres é mecanismo central de perpetuação das desigualdades.

Autoridade, nesse modelo, é confundida com autoritarismo e divergência é tratada como afronta.

Marina não se curva, e é justamente essa postura que a torna alvo dos que veem na autonomia feminina uma ameaça à ordem que desejam preservar.

Sua presença desestabiliza um campo político ainda regido por valores hierárquicos que naturalizam a exclusão das mulheres e sustentam práticas marcadas pela brutalidade simbólica.

A misoginia, nesse contexto, não é um desvio ou excesso, mas parte estrutural da linguagem e das estratégias de setores da extrema direita, articulada para deslegitimar vozes dissidentes, mobilizar ressentimentos e reforçar padrões de dominação.

Quando um senador diz a uma ministra que ela deve “se colocar no seu lugar”, é ele quem revela não saber qual é o seu.

E cabe à sociedade democrática lembrar a cada mandatário político que o único lugar legítimo na vida pública deve ser aquele construído com dignidade e respeito às mulheres, condição indispensável para a realização do bem comum.

Enfrentar essa lógica machista e misógina exige mais do que resistência individual.

Implica o fortalecimento de lideranças femininas, a consolidação de políticas públicas comprometidas com a igualdade de gênero e a construção de uma cultura política que reconheça o respeito como fundamento inegociável da democracia.

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