Em um instigante livro, ‘Natureza, cultura e desigualdades’ (2024), editado pela Civilização Brasileira, Thomas Piketty trouxe reflexões necessárias.
De acordo com o economista francês, as forças das mudanças históricas “foram as mobilizações social e política, assim como a capacidade de criar oportunidades institucionais”.
Farei alguns comentários sobre o assunto.
A posse do capital determina a estrutura de poder. Entre nós, o Plano Safra 2024/2025 disponibilizou R$ 400 bilhões para a agricultura empresarial.
Nas estatísticas do Banco Central consta que, no acumulado em doze meses, os juros nominais alcançaram R$ 935,0 bilhões (7,8% do PIB) em março de 2025.
O ministro Fernando Haddad, da Fazenda, afirmou publicamente que o Brasil tem uma “caixa-preta” de R$ 800 bilhões em renúncias fiscais.
O Brasil é citado logo no início do livro.
Segundo Piketty, “a América Latina como um todo é bastante marcada pelas desigualdades relativas a propriedades”.
Ele completa afirmando que “de modo geral, a presença da herança colonial é muito constante na estrutura das desigualdades”.
Para os interessados, a World Inequality Database é uma importante fonte de pesquisa.
Um país nunca é igualitário ou desigualitário por natureza.
Conforme avaliou Piketty, “tudo depende de quem controla o Estado e com qual objetivo”.
A trajetória histórica importa.
Nesse sentido, o autor destacou a aplicação da tributação progressiva ao longo do século XX, ou seja, algo que poderia ser chamado de “pacote civilizacional”.
O que seria esse pacote? Piketty ressaltou uma combinação: “a constituição de instituições democráticas em sintonia com as instituições fiscais permite evitar que a democracia se transforme em plutocracia”.
Entre 1932 e 1980, a alíquota superior de tributação federal, na média, foi de 80% nos Estados Unidos.
A preferência pela liquidez da plutocracia estava sendo contida em favor da democracia.
Segundo avaliou Piketty, “a história do imposto progressivo ao longo do século XX, portanto, é riquíssima”.
O crescimento da produtividade norte-americana de então, sobretudo no setor industrial, foi favorecido pelos avanços na educação da população.
A tributação progressiva, por sua vez, viabilizou a democracia liberal e o Estado social em diversos países desenvolvidos.
Piketty chamou a nossa atenção para o fato de que “os problemas das desigualdades e desafios climáticos e ambientais estão intimamente ligados”.
A distribuição das responsabilidades históricas pelos danos ambientais é assimétrica entre e dentro dos países.
Instituir um sistema de tributação progressiva sobre rendas e patrimônios revela-se, portanto, uma necessidade de sustentabilidade civilizacional.
Ainda enfrentamos os “moinhos de gastar gente” quando analisamos o cenário através da expressão utilizada pelo professor Darcy Ribeiro para descrever o processo histórico de exploração laboral de seres humanos no Brasil.
A informalidade tornou-se crônica para 38% dos trabalhadores ocupados, sendo que a taxa composta de subutilização laboral está em 15,4%.
Números do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostram que, em abril, o preço dos alimentos básicos aumentou em 15 das 17 capitais pesquisadas.
De acordo com o Dieese, “o salário mínimo necessário para a manutenção de uma família de quatro pessoas deveria ter sido de R$ 7.638,62 ou 5,03 vezes o mínimo reajustado em R$ 1.518,00”.
Distopia tropical em marcha firme?