A matemática política não mente: o presidente Lula conta, apenas, com apoio firme de 70 parlamentares de centro esquerda, na Câmara, contra mais de 300 de direita e ultradireita que fecham com o presidente da Casa legislativa, deputado Arthur Lira (PP-AL), virtualmente, primeiro-ministro parlamentarista que colocou, na prática, o chefe do Executivo na condição de Rei da Inglaterra.
Lira, ao retirar, mediante emendas parlamentares, cerca de R$ 60 bilhões do orçamento da União, que iria para o PAC lulista, transforma-se no comandante efetivo das eleições municipais, porque quem terá dinheiro, no bolso, para negociar com prefeitos e vereadores, será ele e não Lula.
O cabo eleitoral financeiro do pleito municipal em 2024 será o primeiro-ministro parlamentarista do novo regime político brasileiro, estabelecido depois do golpe de 2016, que criou as bases para o domínio amplo da direita.
Os direitistas perderam a guerra eleitoral para a presidência da República, ocupada por Lula, mas ganharam o poder efetivo que se amplia no parlamento onde possuem ampla maioria, por meio das novas regras parlamentares que alimentam seus correligionários nos 5.560 municípios brasileiros em ano eleitoral.
O amplo golpe da direita se consolidaria, agora, se a maioria reacionária resolvesse convocar Assembleia Nacional Constituinte.
A guerra política entre legislativo e executivo transcorre, portanto, sob o signo do parlamentarismo, que desbancou o presidencialismo, violando, claramente, a Constituição de 1988, essencialmente, presidencialista.
A virada de mesa do parlamentarismo, no momento, dominado por forças políticas neoliberais, está sendo, na prática, golpe de Estado, por se revelar, com todas as letras, inconstitucional.
Restaria ou não à esquerda denunciar o golpe ao STF guardião da Constituição?
Parlamentarismo Inconstitucional
O novo poder parlamentarista está, completamente, dissociado do interesse social, da maioria que elegeu Lula, com programa desenvolvimentista, enquanto o neo-parlamentarismo segue orientação neoliberal antidesenvolvimentista, sob comando de forças econômicas e financeiras dominadas pela Faria Lima e Banco Central Independente(BCI), sustentáculo da maior taxa de juros do mundo.
A Faria Lima e o BCI vão na linha contrária à Constituição, teoricamente, presidencialista, sintonizada com o programa social desenvolvimentista prometido por Lula, na campanha eleitoral.
O neo-parlamentarismo, em 2024, segue o curso que iniciou em 2023, de usurpar o poder do presidencialismo lulista, na tarefa de impedir a execução do poder social-democrata.
Para tanto, faz o jogo do capital financeiro especulativo que sustenta política macroeconômica neoliberal, empenhada na máxima desmoralizada de que primeiro o governo deve cortar gastos para fazer poupança e só, então, investir, em vez de, ao contrário, investir para dispor de poupança capaz de realizar novos investimentos etc.
Lira aprofunda luta de classes
Nessa lógica, o neo-parlamentarismo obedece ao Banco Central Independente, serviçal do mercado financeiro, segundo o qual continua sendo imprescindível a macroeconômica neoliberal baseada no tripé econômico ditado pelos credores da dívida pública: metas inflacionárias, câmbio flutuante e superávit primário.
Há, nesse contexto, um racha entre os setores produtivos e financeiros, visto que os empresários, finalmente, passaram a entender que o discurso de Washington favorável ao superávit primário – ou mesmo o tal déficit zero – não passa de outra coisa senão transferir dinheiro da produção para a especulação em prejuízo do emprego, renda, consumo, arrecadação e investimento.
Essa mudança se verifica, no momento, por exemplo, com as posições da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e suas filiadas, sendo a principal delas, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo(FIESP), no que tange ao programa de industrialização do governo.
Os empresários abandonam o discurso do tripé econômico dos banqueiros/BCI, por entenderem que a pregação de déficit zero ou superávit primário é mera transferência de renda das forças produtivas para as forças especulativas, em prejuízo dos gastos sociais que puxam a demanda global desenvolvimentista.
Rei ultraneoliberal
O “Rei” Arthur Lira voltou do recesso parlamentar mais comprometido do que nunca com as forças especulativas, com a Faria Lima e com o BCI, ao dobrar as apostas nas emendas parlamentares que se aproximam dos R$ 60 bilhões, para esvaziarem o PAC lulista, sob argumento de que o neo-parlamentarismo que comanda é o poder comprometido com a sociedade, quando ocorre, justamente, o contrário.
O neo-parlamentarismo lirista apenas aprofunda a luta de classes em favor da elite financeira ao subtrair do executivo as verbas programadas para os setores sociais sem os quais o desenvolvimento econômico sustentável não se realiza.
O golpe de Estado parlamentarista tensiona as relações de classe para fortalecer as elites rentistas que usam o parlamento como escudo para destruir o PAC, a fim de auferir, pelo arcabouço fiscal monetarista, os recursos capazes de continuar engordando os especuladores na dívida pública, sem correspondência alguma com o crescimento sustentável da economia.
Lira vira instrumento do sistema financeiro para bombardear o PAC e tentar inviabilizar o sucesso eleitoral lulista nas eleições municipais de 2024, que são as bases de fortalecimento do presidente para a sucessão de 2026.
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